As 16 datas que mudaram o mundo: 14- O TRATADO DE ROMA (FORMAÇÃO DA COMUNIDADE ECONÔMICA EUROPÉIA – BASE PARA A UNIÃO EUROPÉIA)

 

Por Pierre Miquel (1930-2007) - Historiador francês
Por Pierre Miquel (1930-2007) - Historiador francês

A partir de 25 de março de 1957, os tratados de Roma criaram a CEE, Comunidade Econômica Européia.

Antes de 1957, a Europa, que é constituída em nações antagonistas, está entregue às revoluções, às guerras de independência, aos imperialismos, às angustiantes rivalidades econômicas. Sua unificação é um sonho de intelectual, uma idéia que parece impossível de colocar em marcha.

Depois de 1957, a Europa unida conhece um crescimento rápido, ignora durante meio século as guerras, começa na concórdia e na prosperidade a construção política de suas instituições, para se posicionar no mundo como um grande conjunto democrático.

 

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 Antes de 1957, a Europa é profundamente dividida pelas rivalidades dos Estados, que se transformaram progressivamente em nações, por meio de revoluções e de guerras de independência nacional.

Ela surgiu, esfacelada e diminuída, da unidade do mundo romano após a queda deste no século V Foi então invadida durante cinco séculos por povos saqueadores; foi separada do Mediterrâneo oriental, fonte de riqueza, pelo avanço do Islã. A unificação, sonhada em torno de um pensamento cristão e pela foice de Carlos Magno, é colocada em questão pelas lutas dinásticas e pelos longos conflitos da Guerra dos Cem Anos entre os principais reinos organizados em Estados: a França e a Inglaterra.

Graças ao ouro e à prata das Américas, a Espanha de Carlos V ameaça reconstituir em seu proveito a União Européia de maneira hegemônica, mas o avanço dos turcos no leste e a obstinada resistência dos reis da França e da Inglaterra abortam o projeto dos “Imperiais”. A Europa divide-se então em potências rivais como a Espanha e Portugal, as cidades livres da Alemanha e da Itália, os impérios orientais dos Habsburgos, e breve os dos Romanov na Rússia e o do Grande Turco no Oriente.

O poderio militar e naval permite à França e à Inglaterra impor-se sobre as potências rivais, reduzir as potências mediterrâneas, submeter a Holanda, dominar o continente arrasado pelas guerras de religião (20 milhões de mortos na Alemanha e na Europa Central no século XVII), mas o duelo franco-britânico atravessa todo o século XVIII e acaba em 1815 em Waterloo, uma vitória que permite à Inglaterra dominar a Europa e dominar o mundo.

A Europa entra então em uma era de revoluções: depois da constituição da nação francesa em 1789, reprimida, mas restabelecida em 1830 e 1848, a independência da Bélgica e da Grécia dá um tempo aos povos oprimidos que querem escapar aos impérios orientais, e às nações divididas da Europa Central que se reúnem em nações. Foram necessárias duas guerras para constituir a unificação italiana em detrimento da Áustria, três guerras para fazer da Prússia o Estado aglutinador do Segundo Reich alemão, em detrimento da Dinamarca, da Áustria e da França.

Longe de se unir, as nações se dilaceram em conflitos nacionais que se tornam internacionais, pela razão de os Estados europeus serem então os senhores do mundo e disporem dele conforme a sua vontade. Suas rivalidades ultrapassaram os limites do continente para se enfrentar no além-mar. As alianças armadas constituem-se, ameaçando explodir ao menor motivo. O progresso muito rápido dos armamentos torna o novo conflito um dos mais mortíferos: a Primeira Guerra Mundial, com seus dez milhões de mortos, gera a Revolução Russa de 1917, que isola a Rússia da Europa.

Mas ela obriga também os Estados Unidos a intervir e a tentar impor a paz mundial do presidente Wilson, com a Sociedade das Nações, tentativa de um governo democrático do mundo. O Senado americano, isolacionista, rejeita o Tratado de Versalhes, e a Europa, de nações rapidamente constituídas ou reconstituídas, se dilacera em rivalidades fratricidas sob o olhar aparentemente ausente, mas de fato vigilante, dos americanos e dos soviéticos.

O princípio do direito dos povos em dispor de si mesmos havia, em 1919, abolido os impérios europeus que foram substituídos por nações independentes. No lugar do império otomano temos as nações balcânicas. No lugar do império austro-húngaro temos as nações eslavas. No lugar do império czarista temos as províncias russas arrancadas a Lênin pelo tratado alemão de Brest-Litovsk e entregues aos aliados que as fortalecem como nações: Polônia, Romênia, Estados bálticos.

Essas nações tornam-se alvo de inveja para Stalin, Mussolini e Hitler, que levantam emboscadas para recuperar as terras, blefando com a paz do mundo. A Segunda Guerra Mundial, com a derrota das potências fascistas e imperialistas da Europa Central, deixa em 1945, a oeste, uma Europa dividida pela cortina de ferro, arruinada pela guerra e incapaz de se levantar sem a ajuda dos Estados Unidos e do Plano Marshall; e a leste, uma Europa submetida a uma coletivização forçada pela vencedora soviética.

A Europa toma então consciência de que deve se unir para sobreviver e primeiramente assegurar a paz no oeste do continente com a formação de laços comunitários.

Depois do Tratado de Roma, em 1957, a Europa elabora um relatório positivo da união reencontrada. Em 1949, os Estados do Oeste concluíram uma aliança militar, o Pacto Atlântico, que os protegia contra toda veleidade da intervenção do Leste.

Faltava organizar o espaço, primeiramente, para tornar impossível qualquer rivalidade econômica entre as potências do Oeste. A Bélgica, os Países Baixos e Luxemburgo já haviam constituído, em setembro 1944, uma união aduaneira, o Benelux. A ideia de Robert Schuman era estender o entendimento econômico a todos os Estados do Oeste. Ele começou constituindo a Comunidade Européia do Carvão e do Aço numa época em que a energia ainda provinha, em grande parte, do carvão. Em 1950, a CECA era o início das instituições européias.

A Organização Européia de Cooperação Econômica (OECE), suscitada pelo Plano Marshall, permitirá, a partir de 1948, a realização da liberação das trocas entre a Europa e o resto do mundo, ajudada pela UEP, União Européia de Pagamento. A OECE torna-se, em 1961, a OCDE: Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico, reforçando a concepção liberal da instituição ao integrar a Europa no circuito de trocas com os países do Atlântico Norte.

Os artífices da Europa, como o belga Spaak, o alemão Adenauer, o italiano de Gasperi, os franceses Schuman e Jean Monnet, já pensavam na constituição de uma Europa política. Era prevista uma aliança militar desde a conclusão do Tratado de Bruxelas em 1948. A oposição da França à CED (Comunidade Européia de Defesa) não impediu a criação, pelos Estados ocidentais, da UEO (União Européia Ocidental).

Em 1948, um Congresso para uma Europa unida, reunindo dezenove países em torno de Churchill, obteve a criação de um Conselho da Europa encarregado de realizar a união política e de desempenhar um papel garantido na jurisprudência em matéria de direitos humanos.

Com a criação do Mercado Comum Europeu ou Comunidade Econômica Européia (CEE), acompanhado do Euratom, seria dado o pontapé inicial à Europa dos Seis (França, Alemanha, Itália, Benelux). Em 1968, os direitos aduaneiros eram definitivamente suprimidos entre os Estados-membro. As trocas acusavam um crescimento espetacular. A Europa saía da penúria para entrar em uma era de abundância.

Esse sucesso manifesto encorajava as uniões. Em janeiro de 1973, a Europa dos Seis tornava-se a Europa dos Nove, após a entrada da Grã-Bretanha, da Irlanda e da Dinamarca. Com 255 milhões de habitantes, ela já era a segunda potência econômica mundial. A Europa se abria então aos seis países-membro da zona de livre-mercado e organizava, em 1975, a associação com os quarenta e seis países do Terceiro Mundo. Em 1981, a CEE admitia em seu seio a Grécia, em 1986, a Espanha e Portugal. Já éramos a Europa dos Doze. A Áustria, a Suécia e a Finlândia pediam em 1995 o ingresso no santuário, o que elevava para quinze o número de países-membro…

Uma organização política era necessária, bem como uma moeda comum. Em 1976, fora decidida a eleição de um Parlamento europeu com sufrágio universal. Os representantes para o Parlamento em Estrasburgo foram eleitos por 185 milhões de eleitores em junho de 1979. O Tratado de Maastricht e o crescimento constante dos trabalhos do Conselho de Bruxelas obrigavam os dirigentes dos países europeus a se entenderem, primeiramente, para implantar a moeda comum, o euro, e o Banco Europeu, para imaginar a formação de um exército comum e de uma diplomacia harmônica, e talvez até mesmo implantar instituições unitárias de natureza política, permitindo à Europa falar como uma só voz no palco do mundo e assim propor suas próprias mediações nos conflitos que ensangüentam o planeta.

Os criadores da Europa, signatários do Tratado de Roma em 1957, eram somente seis. Eles constituíram a armação fundadora do continente, uma instituição em perpétua evolução que permite criar uma autoridade comum e abrir progressivamente aos países do Leste libertados, desde 1989, com a queda do Muro de Berlim.

 

 

Pequena Cronologia

 

 

  • 476: Queda do Império Romano do Ocidente. 
  • 800: Coroação de Carlos Magno.
  • 960-1100: Conversão, ao catolicismo, da Escandinávia, da Boemia, da Polônia e da Hungria.
  • 962: Fundação, por Oto, o Grande, do Santo Império Romano Germânico, que desaparecerá somente em 1806. 
  • 1098: Criação da Ordem Cisterciense.
  • 1337-1453: Guerra dos Cem Anos entre a França e a Inglaterra. 
  • 1453: Queda do Império Romano do Oriente. 
  • 1479: Casamento dos reis católicos da Espanha. 
  • 1480: Reunião das terras russas pelo principado de Moscou. 
  • 1492: Descoberta da América e fim do domínio muçulmano na Espanha.
  • 1521-1559 e até 1648: Lutas da França contra Carlos V, depois contra os Imperiais, que terminam com o Tratado de Vestefália, consagrando a divisão religiosa e política da Europa. 
  • 1618-1648: Guerra dos Trinta Anos. Vinte milhões de mortos na Europa.
  • 1651: Ata de navegação seguida da guerra anglo-holandesa de 1652-54 que estabelece a preponderância inglesa nos mares. 
  • 1763: Tratado de Paris. Ruína do primeiro império colonial francês e afirmação da Inglaterra como primeira potência marítima.
  • 1776: Independência das colônias americanas. 
  • 1815: Primazia da Inglaterra na Europa e no mundo. 
  • 1830: Guerra de independência grega. 
  • 1830-1831: Insurreição polonesa. 
  • 1831: Independência belga.
  • 1861: Criação do reino da Itália após uma guerra franco-ítalo-austríaca.
  • 1867: Vitória da Prússia sobre a Áustria em Sadowa. Bismarck unificador da Alemanha.
  • 1867: Criação do Império da Áustria-Hungria, dupla monarquia. 
  • 1871: Criação, na Galeria dos Espelhos do Palácio de Versalhes, do II Reich alemão após a vitória contra a França. Anexação da Alsácia e da Lorena.
  • 1919: O Tratado de Versalhes remodela a Europa de acordo com as nacionalidades.
  • 1933-1939: Agressões hitleristas e anexações feitas pela Alemanha na Europa Central e pela Itália na Albânia, sob o pretexto de reparar os erros do Tratado de Versalhes. 1944: Criação do Benelux.
  • 1945: Conferência de Potsdam, prólogo da cortina de ferro. 
  • 1947: Adesão dos países da Europa Ocidental ao Plano Marshall.
  • 1948: Organização Européia de Cooperação Econômica, que se tornou, em 1961, a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OCDE).
  • 1948: Tratado de Bruxelas. Acordo militar contra a Europa do Leste.
  • 1949: Assinatura do Pacto Atlântico com a criação da OTAN (Organização Militar dos Países do Atlântico Norte).
  • 1949: Criação do Conselho da Europa.
  • 1951: Criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço.
  • 25 de março de 1957: Tratados de Roma criando a Comunidade Económica Europeia e o mercado comum dos seis.
  • 1963: Veto do general de Gaulle à adesão da Inglaterra na CEE.
  • 1969: Encontro de Haia; admissão da Grã-Bretanha.
  • 1973: Europa dos Nove, pela adesão da Grã-Bretanha, da Irlanda e da Dinamarca.
  • 1976: Princípio da eleição do Parlamento Europeu com sufrágio universal. Eleições em junho de 1979. Estabelecimento de um Conselho europeu com vocação política.
  • 1981: Admissão da Grécia, em 1986, da Espanha e de Portugal: Europa dos Doze.
  • 1993: Entrada em vigor do Tratado de Maastricht.
  • 2000: Nascimento do euro, moeda comum européia. 

 

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