Jeanne Baret, a botânica que precisou se disfarçar de homem para realizar descobertas

(Representação visual gerada pela IA Leonardo)

A atuação das mulheres no desenvolvimento do conhecimento científico esteve envolvida em enormes desafios e a história da botânica Jeanne Baret exemplifica muito bem isso. Nascida em 1740 em uma família camponesa de Burgundy, na França, o trabalho do plantio despertou desde cedo seu interesse sobre a variedade dos vegetais e como se desenvolvem. Ela dedicou especial atenção às propriedades curativas das plantas e virou uma especialista autodidata.

O conhecimento e interesse da jovem camponesa atraiu viúvo e nobre Philibert Commerson, que também se dedicava aos estudos das plantas e era um botânico experiente e reconhecido. Jeanne começou a trabalhar para ele como ajudante e governanta, mas durante o vínculo entre patrão e funcionária chegaram a ter um caso que não foi legitimado aos olhos da comunidade e da lei por meio de um casamento. Eles chegaram a ter um filho que foi dado para a adoção e foram embora para Paris, onde continuaram a viver juntos.

Commerson foi convidado para integrar uma expedição comandada pelo explorador Louis-Antoine de Bougainville (1729–1811) com o objetivo de dar uma volta ao mundo reivindicando territórios e fazendo registros científicos e cartográficos. O grupo partiu da França em 1766 com planos de explorar diversos lugares, incluindo a América do Sul, o estreito de Magalhães, o Oceano Pacífico, a Oceania, e voltar pela Índia e Atlântico, completando assim uma ousada e arriscada uma circum-navegação. Commerson não queria que sua amante e ajudante ficasse de fora desta oportunidade de conhecer e identificar novas espécies de plantas no decorrer do percurso, mas uma mulher não seria admitida como parte da tripulação. A solução encontrada foi disfarçar Jeanne de homem para que ela pudesse se juntar à expedição sem chamar a atenção.

Aos 26 anos de idade Jeanne embarcou no navio Étoile e seguiu viagem na famosa Expedição Bougainville com sua identidade oculta e com uma indisfarçada motivação para encontrar uma grande variedade de vegetais para estudar. Ela e Commerson coletaram milhares de exemplares de plantas e fizeram descobertas importantes para os estudos botânicos. Quando passou pelo Brasil Jeanne foi a primeira a identificar um gênero de plantas trepadeiras e arbustos que chamou a atenção por sua beleza e que posteriormente ficaram conhecidas como Bougainvillea, homenagem ao líder da expedição. A participação ativa e descobertas de Jeanne foram anotadas por Commerson, evidenciando sua contribuição como cientista.

O disfarce não se sustentou até a chegada no Taiti, onde nativos perceberam que a pessoa que estava entre eles coletando plantas não era um homem. Depois de denunciada sua identidade, Jeanne enfrentou reações duras por parte da tripulação. Ela foi assediada de forma grosseira, quando outros participantes da expedição decidiram comprovar se ela era mesmo uma mulher, tendo suas roupas arrancadas e até podendo ter sofrido agressão sexual ainda mais grave. Depois do incidente ela e Commerson continuaram na expedição até a chegada na ilha de Maurício, onde desembarcaram e passaram a viver. Em Maurício ela continuou servindo a Philibert Commerson até sua morte em 1773.

Ainda em Maurício ela conheceu o marinheiro francês Jean Dubernat e acabaram se casando. De lá, o casal voltou para a França e assim, finalmente, Jeanne conseguiu concluir sua volta ao mundo, sendo a primeira mulher a realizar tal façanha. Apesar de sua experiência como pesquisadora e mesmo recebendo uma pensão do governo francês por seus serviços, Jeanne Baret passou a levar uma vida afastada dos estudos botânicos formais em Saint-Aulaye. Ela morreu em 1801, aos 67 anos.

O reconhecimento por sua contribuição para os estudos científicos da botânica só ocorreu muitos anos após sua morte.


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