A higiene e os maus hábitos dos brasileiros no período colonial

Contribuição do blogueiro histórico Mauro Luiz, do blog A História e seus fatos curiosos

A palavra ‘higiene’ não constava no vocabulário até o século XIX. Plantas perfumadas eram queimadas para disfarçar mau cheiro. Hábito de esvaziar penicos pela janela estava em toda parte, dos pobres aos ricos.

Hoje em dia não comemos mais com as mãos, nem arrotamos publicamente e nem defecamos e urinamos em praça pública, mas até que isso não acontecesse, percorremos um longo caminho.

A palavra higiene não constava no vocabulário até meados do século XIX. Existem diversos relatos de viajantes estrangeiros, já dotados de boas maneiras, que ao passarem pelo Brasil, sobretudo no Rio de Janeiro, ficavam impressionados com a repugnante sujeira das casas. Raramente o interior de uma casa era limpa e quando muito era varrido por uma vassoura de bambu. Água no chão, nem pensar. As paredes que eram apenas caiadas se tornavam amarelas. A fim de se tornarem os quartos toleráveis, queimava-se plantas perfumadas para disfarçar o mau cheiro. Esses odores também mantinham-se afastados, aquilo que os viajantes chamavam de “atacantes invisíveis”, ou seja, mosquitos e baratas e outras imundícies mais.

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Despejo de dejetos no mar

Naquela época as pessoas não se davam conta da falta de higiene total, tanto nas casas de pobres como nas dos ricos. Tinha-se por hábito esvaziar os penicos pela janela dos sobrados gritando “água vai!”, justamente para que as pessoas que estivessem embaixo se protegessem.

Mas, o que mais impressionava, eram as maneiras à mesa. Não havia qualquer preocupação com o uso de talheres. Era hábito durante as refeições, os homens ao chegar da cidade, tirarem toda a vestimenta para que a refeição não se tornasse muito incomodada e acalorada. Ficavam só de calção e uma camisa meio que aberta no peito e de pés descalços.

Segue relato de um viajante inglês: ” …os maus modos à mesa eram visíveis. Comem muito com grande avidez. A altura da mesa faz com que o prato fique no nível do queixo. Cada qual espalha seus cotovelos ao redor, colocando o pulso na beirada do prato, fazendo que, por meio de um movimento hábil, o conteúdo todo seja despejado na boca. Por outros motivos além desse, não há grande limpeza nem boas maneiras durante a refeição. Os dedos são usados tanto quanto o próprio garfo…”

Nota-se que não havia preocupação nenhuma quanto à presença de visitantes à mesa. Os maus hábitos durante as refeições eram comuns em qualquer situação, tanto entre ricos como entre pobres.

Apesar do dito que o brasileiro aprendeu a tomar banho com os indígenas, naquela época, os banhos e a limpeza corporal não eram apreciados pela população em geral. Os pés eram geralmente a parte mais limpa do corpo, simplesmente porque havia bicho-de-pé, e isso incomodava muito. Era uma verdadeira praga. As pessoas limpavam os pés, as mãos, o rosto e os braços e o resto era sujeira.

De acordo com relatos dos médicos do século XIX, doenças de pele eram comuns como sarnas e perebas de todos os tipos. Nas próprias correspondências dos Governadores-Gerais aos seus familiares em Portugal, eles diziam que se conservavam bem livre de perebas, sarnas e bichinhos do pé.

Apesar do acesso a água ser difícil, pois ela vinha no lombo de burros ou carregada por escravos, é notório que não havia aquele entusiasmo por um bom banho, haja vista que D. João VI, só tomava banho de mar obrigado para curar uma pereba que ele tinha na perna.

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D. João VI

Outra praga comum era o piolho, porém, o que mais chamava a atenção era que catar piolhos era um passatempo. Há várias gravuras e narrativas de viajantes em que mostram os homens com a cabeça no joelho das mulheres catando seus piolhos. Os estrangeiros ficavam estarrecidos com essa prática, pois reuniam alegremente as pessoas sempre embaixo de uma sombra, depois do almoço com as senhoras catando vagarosamente o cabelo de seus maridos e ouvindo os estalos do piolhos mortos, como se fosse uma espécie de passatempo agradável.

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Piolho

Mas o que mais impressionava era o ato de urinar e defecar em público. Já se tinha na Europa a ideia do “toalete ou WC”, e que mais tarde os barões do café viriam a exportar as primeiras privadas para o Brasil. Na verdade não se tinha a menor cerimônia e era muito comum as mulheres por exemplo, segundo relato de um viajante inglês, “…urinarem descaradamente nas ruas, levantando as saias e fazendo xixi sem se importar em cobrir as vergonhas…”

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“Mijão” – Debret

O exemplo desses maus hábitos também vinha de cima. Segue abaixo a narrativa de um cadete de cavalaria inglês, contrato como mercenário para trabalhar no quartel da Praia Vermelha (RJ) pelo Imperador D. Pedro I:

“Ao romper o dia, chegaram a cavalo D. Pedro e sua esposa acompanhados de camaristas e generais. Não há talvez no mundo soldando tão entendido como o Imperador no manejo prático do exercício da espingarda. Mas de resto, seus modos são grosseiros, falta de sentimento das conveniências. Pois o vi uma vez trepar ao muro da fortaleza, de cócoras, para satisfazer uma necessidade natural. E nesta atitude altamente indecorosa assistiu o desfile do batalhão em continência. Tal espetáculo deixou atônitos os soldados alemães, mas o imperial ator conservou inalterável a sua calma.”

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