Perseguições da Inquisição na colônia espanhola: O caso do Casal Mendizábal

(Representação visual gerada pelas IAs DALL-E e Leonardo)

O Tribunal da Inquisição, instituída pela Igreja Católica ainda no século XIII, para combater as ditas heresias passou a ser empregada contra variadas situação que contrariavam os interesses da instituição e no decorrer dos anos também cruzou o Atlântico durante o período de colonização. No Novo Mundo sua atuação seguiu os habituais rigores e desvios, com inquisidores julgando pessoas acusadas dos variados delitos e outros alegados atos e condutas contra a fé e a igreja. Mas a presença dos tribunais religiosos nas colônias frequentemente acabava atendendo interesses voltados ao controle social e político, agindo em nome de interesses e causas que passavam longe de qualquer aspiração espiritual. Esta aplicação mundana da Inquisição muitas vezes funcionou como ferramenta de repressão nas mãos de poderosos para lidar com seus desafetos, grupos étnicos e demais pessoas que pudessem representar obstáculos.

O processo dirigido contra o casal Bernardo López de Mendizábal e Teresa de Aguilera y Roche pode representar bem o emprego político da acusação religiosa.

Nascido em 1620 em Puebla, no atual México, Mendizábal era filho de um agente da coroa espanhola na colônia, o militar Cristóbal López de Mendizábal e da senhora Leonor Pastrana. Em sua ascendência materna, seu bisavô, Juan Nuñez de Leon, teve seu nome registrado entre os processos inquisitoriais sob acusação de prática ilegal e oculta do judaísmo, o que era considerado uma violação muito grave. Bernardo de Mendizábal estava bastante integrado à elite colonizadora como senhor de terras e atuante na política, recebendo a preparação adequada para figurar em posições de poder. Ele também prestou serviços à Espanha como militar e exercendo cargos administrativos nas colônias de Cuba, Nueva Granada e Nueva España, acumulando experiência e reconhecimento para indicação, em 1659, ao cargo de governador da região de Novo México, onde também se estabeleceu como comerciante.

Teresa de Aguilera y Roche, nascida por volta de 1623, na Espanha e era filha de um militar espanhol com uma dama irlandesa. Por causa da natureza do trabalho do pai, Teresa cresceu em contantes mudanças, tendo vivido em diversos lugares em seu país natal e na Itália, recebendo uma educação refinada. Seu pai foi transferido para servir na colônia e estando no Caribe ela e Bernardo se conheceram e acabaram casando-se por volta de 1650.

A vida do casal no Novo México transcorreu em meio aos compromissos associados ao governo, com Bernardo se ocupando dos assuntos políticos e administrativos e Teresa se envolvendo ativamente nas questões de seu interesse. Marido e mulher atuavam no apoio mútuo e precisaram desta união quando a situação ficou tensa. A postura firme de Mendizábal diante do comando do governo gerou atritos importantes com setores da sociedade e com a Igreja, pois sua política tributária afetava proprietários e não poupava os bens controlados pelo clero, suja autoridade ele não admitia politicamente. Além disso, o governador adotou uma postura moderada em relação aos indígenas, reconhecendo direitos dos nativos diante da iniciativa dos franciscanos de impor o trabalho forçado e a conversão dos nativos. A oposição ao governador unia setores poderosos da colônia, o que levou à deflagração de uma revolta que o destituiu do governo. Como parte ativa e interessada do movimento, a Igreja Católica articulou o Tribunal da Inquisição numa trama contra Bernardo Mendizábal e Teresa de Aguilera y Roche, acusados e processados sob a acusação de prática ilegal do judaísmo.

O casal foi preso em 1663 depois de várias tentativas de escapar das acusações. Bernardo morreu no ano seguinte enquanto estava na cadeia. Teresa conseguiu se defender das acusações e acabou sendo inocentada porque não foram provadas as alegações contra ela. Depois de sua liberação do caso, Teresa tratou de lutar para obter a permissão para exumar o corpo do marido e proporcionar um sepultamento digno, o que só foi possível em 1671, quando o tribunal encerrou definitivamente o processo contra ele. O desfecho da situação evidencia a inconsistência das acusações e o caráter político e vingativo do processo, ressaltando o uso nada espiritual da Inquisição.

Não persistiram informações sobre a vida de Teresa depois do fim do caso judicial religioso, assim a data e local de sua morte são desconhecidos.


Referências: