Eleanor Butler e Sarah Ponsonby: Um casal homoafetivo entre os séculos XVIII e XIV?

(Representação visual gerada pela IA Leonardo)

Eleanor Butler (1739–1829) e Sarah Ponsonby (1755–1831), tiveram a ousadia de fugir de suas famílias e das pressões sociais para poderem viver juntas no século XVIII. Elas começaram a se relacionar em meados da década de 1770, pouco depois de se conhecerem frequentando os mesmos círculos sociais elitistas no Condado de Kilkenny, Irlanda. 

Lady Eleanor Butler era filha do Visconde Ikerrin e sua família tinha longa tradição na linhagem aristocrática católica irlandesa. Como era costume em seu meio, a filha mais nova da família era destinada para a vida religiosa e enviada para um convento, situação que era o caso de Eleanor que, por outro lado, não se agradava da ideia de ser freira, mas sua falta de pretensão matrimonial com o passar dos anos somente reforçava a disposição da família de ir adiante com os planos originais, pois ela já estava se aproximando dos 40 anos de idade. Sarah Ponsonby era dezesseis anos mais jovem que Eleanor e vinha de uma abastada família anglicana. Sendo órfã desde a infância, foi criada por familiares que já estavam providenciando um casamento arranjado para a jovem, mas ela também rejeitava a possibilidade de se ver comprometida e presa a uma união contra a sua vontade.

As duas começaram a compartilhar seus desejos, frustrações e sentimentos e o relacionamento pode ter tomado a forma de uma “amizade romântica” que preocupava suas famílias. Era óbvia a impossibilidade de levar um relacionamento sujeito aos comentários e julgamentos adiante naquela comunidade e enfrentando a rejeição familiar e então elas resolveram fugir juntas. Em 1778 elas resolveram se disfarçar com roupas masculinas e partiram escondidas na calada da noite, mas não chegaram muito longe e foram logo detidas e levadas de volta para suas casas. O incidente alimentou ainda mais a determinação de suas famílias em relação aos planos que traçaram para as duas e elas sabiam dos riscos. Mesmo afastadas e proibidas de estabelecer contato uma com a outra, deram um jeito de tramar uma nova fuga que finalmente deu certo e conseguiram chegar no País de Gales, onde acabaram ficando.

O refúgio galês encontrado era a agradável cidade de Llangollen, onde se estabeleceram em uma modesta casa afastada. Apesar do incômodo da situação e do descontentamento com a fuga, suas famílias ofereceram ajuda inicial para o sustento das duas em sua residência, que passaram a chamar de Plas Newydd (expressão galesa que significa “Nova Mansão”). Posteriormente o próprio rei George III resolveu conceder uma pensão para as duas depois que a rainha Charlotte conheceu e se encantou com a história delas.

Quando chegaram em Llangollen elas eram vistas com certa estranheza pela comunidade local, pois além de forasteiras eram duas mulheres vivendo juntas e isoladas dos habitantes. Com o passar do tempo foram sendo integradas mesmo considerando suas excentricidades, pois cavalgavam feito homens, vestiam peças de roupas masculinas e eram costumeiramente vistas usando cartolas. Elas viraram figuras conhecidas na região, chamadas de “Ladies de Llangollen”. Plas Newydd virou até uma referência na cidade, pois a propriedade virou um ambiente bonito com seu jardim impecável e com as referências góticas que elas adotaram na decoração. Além disso, a comunidade admirava Eleanor e Sarah porque mesmo cuidando de preservar a privacidade eram anfitriãs acolhedoras sempre dispostas a abrigar viajantes e vizinhas atenciosas e simpáticas.

A dupla viveu em Plas Newydd até o fim da vida de cada uma. Eleanor morreu em 1829 aos 90 anos de idade. Sarah a seguiu dois anos depois, tendo vivido até os 76 anos. Elas foram sepultadas juntas no cemitério da paróquia, conforme o desejo manifestado por elas de que nem a morte deveria separá-las.

Uma questão contemporânea envolvendo as vidas de Eleanor e Sarah diz respeito à natureza do relacionamento entre elas. Seriam um casal? Os diários e cartas que produziram não deixaram informações expressamente evidentes como confirmação de que constituíram uma união que indicasse uma relação homoafetiva, embora contenham declarações do quanto se amavam e cuidavam uma da outra. O contexto no qual viveram negava o tipo de convivência que caracterizasse a constituição de um casal formado por duas mulheres, embora elas possam ser vistas como desafiadoras das restrições sociais e normas de gênero da época em que viveram. Interpretações atuais sobre as duas tendem a concordar que a “amizade romântica” que constituíram foi uma história de amor vivida por um apaixonado casal que enfrentou grandes desafios em nome do desejo e necessidade de permaneceram juntas, mas as deduções nunca poderão expressar o que realmente sentiram.


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