“Oh, liberdade, que crimes são cometidos em seu nome! Eles zombam de você!”
Estas são as últimas palavras atribuídas a Marie-Jeanne “Manon” Roland de la Platière (1757-1793), mais conhecida como Madame Roland, diante do instante final de sua existência antes de ser guilhotinada depois de julgada como traidora durante a fase mais radical da Revolução Francesa.
Nascida em Paris e batizada como Marie-Jeanne Phlippon, era filha da classe média. Demonstrando desde cedo uma inclinação para o aprendizado, ela recebeu uma educação notável que despertou seu interesse pela filosofia e literatura. Estudiosa e de mente curiosa, Marie-Jeanne imergiu-se nos ideais do Iluminismo, tornando-se uma defensora apaixonada da razão e do progresso social. Em 1780, seu caminho cruzou-se com o de Jean-Marie Roland de la Platière, um economista e inspetor de manufaturas com quem compartilhava ideias e aspirações iluministas. Eles se casaram, marcando o início de uma parceria tanto amorosa quanto intelectual que eventualmente os levaria ao epicentro da política revolucionária francesa.
O casal Roland rapidamente se tornou uma força formidável na política francesa durante os turbulentos anos da Revolução. Enquanto Jean-Marie ocupava posições oficiais, incluindo a de ministro do Interior, era amplamente reconhecido que Madame Roland exercia uma influência considerável por trás das cenas. Em seu salão em Paris, ela reunia políticos, intelectuais e ativistas, facilitando debates e moldando as ideias revolucionárias da época. Associados à facção moderada dos Girondinos, os Rolands promoveram uma visão republicana que buscava equilibrar os ideais de liberdade e justiça.
À medida que a Revolução Francesa avançava, os Jacobinos, liderados por figuras como Maximilien Robespierre, ganharam proeminência, defendendo uma postura mais radical e uma República baseada na vontade popular absoluta. Com sua ascensão ao poder, iniciou-se o período conhecido como Terror, caracterizado por intensas purgas políticas e execuções em massa. Os Girondinos, entre os quais o casal Roland estava associado, foram vistos como inimigos da verdadeira revolução pelos Jacobinos. Como resultado, muitos Girondinos foram alvo de perseguições, sendo detidos ou forçados ao exílio. Jean-Marie Roland, percebendo a ameaça iminente, teve que fugir de Paris, enquanto sua esposa, Madame Roland, foi capturada e encarcerada. O crescente domínio jacobino e sua abordagem implacável à oposição política marcaram o fim da influência do casal Roland e prenunciaram a tragédia que se abateria sobre muitos de seus contemporâneos.
Durante sua detenção, ela começou a escrever suas memórias, um testemunho vívido de sua vida e dos eventos tumultuados da Revolução. Estas memórias não apenas proporcionariam uma visão valiosa dos eventos da época, mas também destacariam o espírito indomável de uma mulher enfrentando seu destino inevitável. Em novembro de 1793, o destino de Madame Roland foi selado quando ela foi condenada à morte por guilhotina. No momento de sua execução, ela teria se voltado para a estátua da Liberdade na Praça da Revolução e proferido suas famosas últimas palavras.
A Revolução Francesa, embora frequentemente dominada pela narrativa masculina, teve uma significativa participação de mulheres que desempenharam papéis cruciais em vários níveis da sociedade. Elas não apenas marcharam nas ruas, como na famosa “Marcha das Mulheres a Versalhes”, mas também influenciaram o pensamento político e os rumos dos eventos. Além de Madame Roland, outras mulheres também se destacaram e, posteriormente, foram vítimas do radicalismo revolucionário. Olympe de Gouges, por exemplo, foi uma ativista que escreveu a “Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã”, desafiando a marginalização das mulheres na nova ordem republicana. No entanto, suas ideias progressistas levaram-na à guilhotina em 1793. Charlotte Corday, por outro lado, foi responsável pelo assassinato de Jean-Paul Marat, um dos líderes jacobinos, e foi executada por seu ato. Essas mulheres, junto com Madame Roland, exemplificam a complexidade e o custo da Revolução Francesa, destacando que a luta por liberdade e igualdade foi, e continua a ser, um caminho cheio de desafios e sacrifícios.


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