Hunab Ku, uma falsa divindade maia criada pelos cristãos

hunab-ku
O símbolo de Hunab Ku na interpretação “New Wave”

A teologia maia era tão incompreensível para os colonizadores cristãos quanto também era incompreensível para os maias a teologia cristã, então explicar princípios de uma fé para os praticantes de outra gerava muita confusão na compreensão. Diante desse problema os cristãos foram desenvolvendo um princípio religioso artificial que pouco a pouco passou a ser introduzido na cultura maia desde a colonização hispânica. Parte dessa engenharia teológica foi a criação da divindade Hunab Ku como uma forma de elaboração de características da divindade cristã como subterfúgio para a conversão dos nativos indígenas. Diferentemente das demais divindades maias que possuíam no imaginário nativo uma representação até visual, Hunab Ku era invisível e superior aos deuses que os indígenas veneravam. Em lugar de uma figura reconhecível imediatamente pelos sentidos, os frades franciscanos elaboraram uma divindade de forma abstrata para representar esse ser superior que iria facilitar a difusão da ideia do Deus do Cristianismo.

Num dicionário espanhol do século XVI que circulava nos domínios coloniais Hunab Ku é descrito como “o único deus vivo e verdadeiro, também o maior dos deuses do povo de Yucatán”, mas não há em fontes maias referências a tal divindade anteriormente à chegada dos espanhóis – a divindade criadora pré-colombiana cultuada pelos maias era Itzamna. Hunab Ku (que no idioma nativo significava “Deus Único”) foi uma criação artificial de sincretismo como oposição ao politeísmo maia.

Para completar a confusão até a representação visual divina hoje atribuída a Hunab Ku é forjada e fora de contexto, pois um manto ritualístico asteca foi a fonte de inspiração tardia para o símbolo atribuído à divindade inventada. Autores como José Argüelles (Joseph Anthony Arguelles), ícone da New Age, ajudou a difundir sua interpretação visual de Hunab Ku como se fosse legítima, inspirada na descoberta de uma suposta antiga tapeçaria indígena. Elaborações modernas do “princípio Hunab Ku” acabaram também forjando aproximações forçadas com elementos orientais – o próprio símbolo foi reinterpretado como uma espécie de “Yin Yang indígena”.

hulam-ku3
Manto ritualístico asteca que teria influenciado a elaboração do símbolo de Hunab Ku

Enfim, a divindade que não existia para os maias até a presença espanhola na Península de Yucatán e que foi engendrada como artifício para facilitar o trabalho missionário de difundir o cristianismo acabou também influenciando concepções muito distantes da própria ideia original e, por incrível que pareça, aparece também em fontes na internet como uma legítima figura da mitologia maia.

Deixe uma resposta

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s