
As onna-bugeisha (女武芸者) e onna-musha (女武者) foram as mulheres combatentes no Japão feudal e viviam em uma cultura de guerra, sendo preparadas para adquirir habilidades indispensáveis em artes marciais, equitação, arco e flecha. A distinção básica entre elas consistia no direcionamento da ação de combate: a onna-bugeisha era uma mulher treinada nas artes da guerra que, em geral, combatia apenas em situações excepcionais, como em defesa pessoal, do lar e da integridade familiar. Já a onna-musha, igualmente qualificada, tinha engajamento direto no campo de batalhas. Todas as onna-musha eram onna-bugeisha (pois tinham o treinamento), mas nem toda onna-bugeisha se tornava uma onna-musha.
Quando ocorriam os cercos, famílias inteiras lutavam para proteger as fortalezas, castelos e cidades, tornando essencial que as mulheres fossem capazes de defender a si mesmas e seus filhos. A capacidade de autodefesa e o uso de tanto (pequenas lâminas) ou naginata (uma alabarda com uma lâmina curva na ponta) eram esperados das mulheres da classe bushi (samurai) e isso era algo comum.
Em algumas situações, a responsabilidade pela defesa do castelo era assumida pela esposa do comandante na sua ausência. Existiam casos em que mulheres também participavam ativamente em movimentos militantes, como as ligas Ikko-ikki, onde todos os membros de uma comunidade participavam da luta, sem distinção de gênero.
Mesmo considerando a presença notável das guerreiras, as representações históricas dessas mulheres são muito incomuns. Isso levou a uma percepção distorcida ao longo do tempo, em que as onna-musha passaram a ser vistas como uma “curiosidade”. A escassez de referências escritas deve-se, em parte, à perda de evidências e registros de suas conquistas devido às práticas de guerra do período feudal, como a pilhagem e a destruição de vilarejos, templos e castelos por figuras como Oda Nobunaga. Além disso, em determinadas circunstâncias, o gênero era considerado menos importante do que a posição social; assim, as guerreiras eram tratadas indistinguivelmente dos homens nos cenários de batalha.
Apesar disso, figuras como Tomoe Gozen, Tsuruhime e Hangaku Gozen, entre outras, se tornaram personagens lendárias, celebradas na literatura, contos tradicionais e peças de Noh (expressão artística japonesa que envolve interpretação, canto e dança).
A destemida Hangaku Gozen foi uma onna-musha que nasceu por volta de 1170, no final do período Heian e início do período Kamakura. Ela nasceu em uma família de guerreiros de elite, samurais altamente prestigiados do Clã Jo (ou Clã Hangaku), e seu pai, Jō Sukekuni, era o líder desse grupo poderoso na província de Echigo (atual Niigata). Os guerreiros de seu clã eram tradicionalmente reconhecidos pela perícia do tiro com arco (kyūjutsu), além da fidelidade ao código de honra, disciplina e dever da classe samurai.
Ela recebeu um rigoroso treinamento nas artes marciais e técnicas de combate, além da equitação, do habitual domínio do kyūdō (“o caminho do arco”) e da naginata. Também foi altamente instruída sobre estratégia militar e adquiriu habilidades de comando, indicando sua posição como figura da alta classe samurai. Apesar de toda base de formação como guerreira, temas como caligrafia, poesia (como waka) e etiqueta fizeram parte de sua formação típica para uma figura da classe dominante.
Hangaku Gozen foi celebrada como uma das guerreiras mais formidáveis do Japão por causa de suas qualificações e pela atuação de destaque na defesa do Castelo de Torisaka durante a Rebelião de Kennin (1201).
Após a vitória do clã Minamoto na Guerra Genpei e com o estabelecimento do Xogunato Kamakura, muitos clãs que apoiaram os Taira ou que se opunham ao novo regime ficaram descontentes. Em 1201, o clã Jō decidiu se revoltar sob a liderança de seu tio Jo Nagamochi. Eles reuniram forças e se fortificaram no Castelo de Torisaka, e Hangaku Gozen participou ativamente da ação como oficial na liderança de combatentes e desempenhando seus dotes de luta. Ela se estabeleceu nas paliçadas e torres de madeira do castelo, disparando flechas com extrema precisão contra as forças do xogunato. Seus disparos não eram apenas precisos, mas poderosos o suficiente para penetrar armaduras e causar baixas significativas.
A guerreira abateu muitos soldados inimigos, incluindo comandantes, criando momentos de pânico e desorganização em suas fileiras. Sua atuação ameaçadora fez dela um alvo, então atingir Hangaku Gozen passou a ser uma meta estratégica. Ela foi atingida por uma flecha na coxa, ferimento que a incapacitou e a forçou a abandonar sua posição. Isso enfraqueceu a defesa do castelo, que acabou sendo capturado pelos oponentes.
Hangaku Gozen teve sua vida poupada e foi presa, apresentada como um “troféu de guerra” — um tratamento humilhante para uma guerreira de sua estirpe, apesar do fato de que até seus captores ressaltaram suas qualidades. Foi colocada sob a custódia de Asari Yoichi Yoshitō, um samurai vassalo do regente Hōjō Yoshitoki. O que seria uma relação opressiva mudou totalmente, e Asari ficou tão impressionado com sua prisioneira que a tomou como sua esposa formal — uma união que também tinha fins estratégicos, pois firmou uma aliança com o clã Jō e sua linhagem.
As informações sobre Hangaku Gozen acabam a partir do casamento. Especula-se que ela decidiu adotar uma vida mais introspectiva, voltada para os interesses domésticos e familiares, embora não se saiba se ela teve filhos. Existe um túmulo atribuído a ela em Ibaraki, mas o ano de sua morte é desconhecido.
Referências:

[…] Hangaku Gozen e o Papel das Mulheres nas Guerras Japonesas […]