
A condição de ser um fora-da-lei pode ter significado genericamente indefinido, pois necessariamente não se aplica à qualificação de um indivíduo como um criminoso comum, um malfeitor que representa uma ameaça para a sociedade. Transitar através da dimensão fora das estruturas legais tem proporcionado uma perspectiva de heroísmo ou vilania dependendo do contexto, posição que notabilizou na história, no imaginário coletivo e nas representações literárias figuras que vão de Robin Hood, nas florestas britânicas, ao infame Virgulino Lampião, no árido Sertão do Nordeste brasileiro. A rebeldia, a ambiguidade moral, a vida aventureira e o carisma dos foras-da-lei mais representativos alimentaram o fascínio das pessoas porque perceberam nestas figuras determinados ideais de atuação livre, a identificação com dramas e histórias significativas e associação a eventuais motivações pela prática de uma forma de justiça fora das regras estabelecidas.
Um dos complexos representantes desse espectro foi David Lewis, que ficou conhecido como “O Robin Hood da Pensilvânia”, notório bandoleiro que atuou nos EUA entre 1810 e 1829, durante a fase que antecedeu aos tempos do Velho Oeste (que se consolidou logo após a Guerra Civil Americana, por volta de 1865–1900). Lewis nasceu por volta de 1790, no condado de Centre, membro de uma família respeitável da região. Seu pai, William Lewis, foi um combatente durante a Revolução Americana e era um cidadão reconhecido pela pela comunidade, situação que impunha certas expectativas a respeito do filho, que tinha seus próprios planos: entrar para o mundo do crime e manchar o nome da família.
Ainda adolescente, David começou a praticar atos ilícitos como pequenos furtos e aplicar golpes para obter dinheiro enganando as pessoas, pois possuía talento para envolver e convencer suas vítimas. Com o passar do tempo ele foi ampliando sua atuação, se envolvendo em atividades criminosas lucrativas como roubo e furto de cavalos e falsificação de dinheiro. Ele tinha uma preocupação de apenas afetar gente abastada, principalmente negociantes, fazendeiros ricos e figuras políticas. Depois de executar suas investidas criminosas, relatos indicavam que ele deixava dinheiro e sacos de alimentos em portas de casas pobres, além de atender pedidos para cobrir dívidas de gente comprometida com débitos aos bancos e outros exploradores. Este comportamento logo motivou uma admiração por seu gesto.
Apesar de várias detenções, não era fácil manter Lewis na cadeia. Ele era habilidoso na arte da fuga e quando não escapava por conta própria, apareciam simpatizantes para ajudar oferecendo abrigo para manter o “justiceiro” seguro. Esta dificuldade de prendê-lo acentuava sua reputação de heroi entre a população pobre, que ressaltava sua perícia e esperteza. Parte da imprensa local noticiava seus feitos e ajudava a difundir sua figura e qualquer notícia a seu respeito aumentava a vendagem dos jornais.
As autoridades estavam sempre tentando encerrar a atuação do fora-da-lei e acabar com sua fama, que representava um vexame para os poderosos. Uma campanha contra ele também fluiu em veículos da imprensa para denunciar seus crimes e desmontar a imagem de um benfeitor popular. Magistrados se empenharam na promoção do discurso da defesa da ordem pública, exemplificando Lewis como um expoente da delinquência. Enquanto isso, caçadas organizadas eram especialmente montadas para promover sua captura.
Lewis acabou trancafiado finalmente na prisão de Cumberland em 1820 após uma troca de tiros que o deixou ferido. Sob custódia, ele escreveu suas memórias como forma de registrar sua experiência e manter vívida uma imagem positiva admirada pelo povo. Lewis justificou suas ações como uma reação aos abusos das elites e à corrupção das autoridades. Sua atividade de falsário foi explicada como uma forma de causar prejuízo aos bancos e distribuir dinheiros para os explorados. Ele não se reconhecia como criminoso e se apresentou como justiceiro, acusando xerifes, juízes e políticos de serem os verdadeiros bandidos, expressando que “todos roubam, mas só os pobres são punidos”.
A biografia expressava um tom de denúncia social e ainda detalhou crimes, circunstâncias e datas de suas ocorrências, apesar de também relatar fatos inverossímeis. A repercussão dividiu opiniões, pois seus admiradores assumiram a obra como um manifesto de Lewis contra as injustiças enquanto seus críticos reforçaram a noção de que ele era um bandido perigoso e uma ameaça à integridade social.
David Lewis morreu na prisão em 1831. As circunstâncias da morte não foram esclarecidas, possibilitando especulações sobre as causas, numa versão ele morreu como decorrência das sequelas do ferimento causado ao ter sido baleado e em outra narrativa comum ela teria sido morto envenenado para encerrar de vez sua influência. Seu corpo foi sepultado numa cova não identificada para evitar eventuais homenagens.
As histórias a respeito de Lewis continuaram sendo difundidas após sua morte através de narradores, da difusão da biografia e de montagens teatrais. Havia quem acreditasse que ele continuava ativo, cavalgando disfarçado e ameaçando as autoridades públicas. Sua figura foi reconhecida como proto-arquétipo do bandido-justiceiro do Velho Oeste.
Referências:
