Ibn Battuta, o explorador do Mundo Islâmico

(Representação visual gerada pela IA Leonardo)

O espírito aventureiro e a fé foram motivações para uma incrível jornada realizada pelo viajante medieval marroquino Ibn Battuta. Nascido em Tânger, em 1304, ele era procedente de uma família berbere de tradição na status de qadis (juízes islâmicos). Tânger era uma cidade agitada porque concentrava uma intensa atividade comercial, conectando pelo Mediterrâneo a Europa, a África Subsaariana e o Mundo Islâmico. O poder na região era exercido pelo Sultanato Marínida, cujo controle correspondia aos territórios dos atuais Marrocos, Argélia e Tunísia.

A situação de seu lugar de origem favorecia o empreendimento de aventuras para lugares distantes e o curioso e o desbravador Ibn Battuta al-Lawati não quis desperdiçar a oportunidade. Ele pretendia seguir a carreira como um qadi, por isso achou importante aprofundar seus conhecimentos e experiências religiosas no Dar al-Islam, vasto mundo território onde o Islamismo era praticado. Aos 21 anos iniciou uma jornada para a realização do hajj, tradicional peregrinação para Meca. Ele passou pelas diferentes terras do Sultanato Marínida e esteve no Egito, passando pelo Cairo e Alexandria, até seguir para seu primeiro destino, mas ao chegar à cidade sagrada ele sentiu que seu destino era continuar indo em busca de novos locais para aprofundar seu conhecimento, então seguiu para locais como o Iraque, Irã, Síria e a Península Arábica, até retornar para Meca, encerrando essa etapa de experiências em 1332.

Em outras fases de suas jornadas pelo Dar al-Islam, ele foi para o Iêmen, o Quênia, depois esteve na Turquia, na região da Horda Dourada, no sul da Rússia. Conheceu Constantinopla, um dos raros domínios cristãos visitados em seu incansável itinerário através dos continentes conhecidos em seu tempo. Ele foi para a Ásia Central, Afeganistão e chegou até a Índia, onde exerceu funções públicas sob as ordens do sultão Muhammad Tughluq, que o designou como embaixador na China.  De lá, ele partiu para se estabelecer no Sri Lanka e depois Maldivas e várias regiões do Sudeste Asiático. Nas Maldivas seu trabalho como juiz foi motivado pelo intuito de modificar os costumes locais, sobretudo em relação aos hábitos que ele considerava imorais como a liberdade feminina e o costume da nudez cotidiana as mulheres locais, mas o insucesso da missão o fez voltar para a China em 1346.

Entre 1346 e 1354, Ibn Battuta voltou para a África, inicialmente de volta ao Marrocos, onde descobriu que toda sua família havia morrido devastada por uma peste. A tragédia não desfez seu ímpeto viajante e ele foi para a Espanha, vivendo um tempo no Reino de Granada, até decidir ir para o africano Império do Mali, onde conheceu o rei Mansa Musa, se impressionou com a riqueza do nobre e ficou escandalizado com a liberdade das mulheres de lá. Suas jornadas de conhecimento sobre a vastidão do Mundo Islâmico, sobre a experiência da fé em diversos lugares e sobre a diversidade cultural finalmente o conduziram definitivamente para o Marrocos em 1354, quando ele encerrou sua vida errante.

As viagens de Ibn Battuta foram apoiadas por patrocinadores como indivíduos ricos e governantes muçulmanos que se dispuseram a oferecer desde roupas até escravos. Favorecer artistas e estudiosos não era uma prática incomum e a generosidade de anfitriões também contribuía para a manutenção de viajantes de seu status, mas ele não se limitava a sobreviver de favores e exerceu atividades remuneradas no decorrer de suas migrações. Seu conhecimento dos preceitos religiosos e da lei islâmica, além da boa reputação que foi conquistando, abriram portas para que ele trabalhasse com qadi, além de professor e conselheiro. Sua habilidade diplomática e experiência acumulada através das viagens e interações internacionais também lhe valeram uma colocação como embaixador, prestando serviço na Índia e na China. 

Ibn Battuta percorreu suas longas e variadas viagens por terra principalmente através de caravanas de mercadores e peregrinos, pois as jornadas realizadas em grupos eram mais seguras e viáveis. As rotas aquáticas também aproveitavam as missões comerciais, que se organizavam através da atuação de marinheiros habilidosos. 

Os perigos através das expedições eram consideráveis. Além dos ataques de bandidos, os riscos ambientes eram ameaças persistentes e o viajante encarou variadas situações problemáticas. Ele sobreviveu a um naufrágio devastador na costa indiana, pendendo praticamente todos os seus pertences, inclusive seus escravos. As calamidades proporcionadas por doenças também eram ocorrências presentes em suas andanças e ele testemunhou pestes catastróficas, escapando ileso das ameaças patológicas. 

Ibn Battuta teve ao menos sete casamentos e vários filhos ao longo de suas trilhas, mas sua vida itinerante impediu a convivência familiar. Ao seu restabelecer no Marrocos, ditou sua vida e viagens para o escritor Ibn Juzayy, que produziu a obra “Rilha” resultante desses registros. As descrições apresentaram detalhados aspectos sobre diferentes povos, culturas e costumes, sendo um rico trabalho de um proto-antropólogo, além de apresentar um minuncioso panorama geógrafico dos lugares visitados.

Depois de façanhas e experiências impressionantes, ele morreu por volta de 1369.


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