Caracala e Geta: Ódio, rivalidade e caos no comando do Império Romano

(Representação visual gerada pela IA Midjourney)

A Dinastia dos Severos, fundada pelo imperador Septímio Severo, teve sua continuidade através de seus filhos Caracala e Geta. O imperador e sua esposa, Júlia Domna, estavam determinados a preparar os príncipes para governar, contudo os irmãos protagonizaram uma experiência de poder e liderança caótica e sangrenta quando assumiram suas funções como condutores do Estado e de seu vasto território. 

O mais velho dos dois era Caracala, nascido em 188 d.C. em Lugduno (atual Lyon, França). Seu nome de nascença era Lucius Septimius Bassianus e posteriormente adotou o nome oficial de Marcus Aurelius Antoninus, embora fosse popularmente conhecido por seu apelido, inspirado na peça de vestuário caracalla, uma espécie de capa longa com capuz que ele costumava usar. Ainda na infância foi nomeado pelo pai como César, título que indicava sua posição de sucessor, e aos 10 anos de idade recebeu o status de co-imperador. Publius Septimius Geta nasceu em Roma um ano após o irmão e foi designado César aos 10 anos e Augusto aos 20, assumindo o status de co-imperador juntamente com Septímio Severo e Caracala. 

Com a morte de Septímio Severo, em 211 d.C., os irmãos assumiram o poder por conta própria, mas não agiram de forma colaborativa como desejado pelo pai. Caracala e Geta mantinham uma relação de animosidade mútua, marcada por desconfiança, rivalidade e ódio. A situação era tão extrema que os dois evitavam contatos, dividiram o palácio imperial em ambientes separados, eram cercados por cortes rivais, proibiram as mínimas interações entre serviçais e assessores com qualquer pessoa que atuasse do lado do outro imperador e até comandavam soldados concorrentes. Os imperadores só se encontravam quando cercados por seus próprios guardas pessoais e com a presença da mãe, Júlia Domna, que tentava inutilmente estabelecer uma conciliação e atuava como conselheira de Estado para os dois. Era uma circunstância que afetava o cotidiano do funcionamento do governo e a estabilidade política do império, pois a administração ficava envolta em uma atmosfera de conspiração, desentendimento, divisionismo e falta de comando. 

O ápice da situação foi a manobra de Caracala para se livrar do próprio irmão e assumir o poder sozinho. Pouco mais de um ano desde o início do governo compartilhado, Júlia Domna organizou um encontro entre os filhos para tentar solucionar a rivalidade que atrapalhava o império, mas Caracala aproveitou o ato para efetivar seu plano de poder e preparou uma emboscada durante a reunião, quando guardas sob suas ordens invadiram o recinto e esfaquearam Geta, que morreu aos 22 anos de idade nos braços da mãe. 

Após o assassinato, Carcacala assumiu o poder de maneira absoluta e instituiu a damnatio memoriae, medida que condenava até a menção ao nome de Geta, além da destruição de monumentos, estátuas e documentos referentes ao irmão. Foi instituída uma perseguição intensa e sanguinária aos apoiadores do imperador assassinado, atingindo cerca de 20 mil pessoas mortas por associação direta ou indireta a Geta, incluindo funcionários do Estado, militares e membros do Senado. Apesar do extremo da situação, Júlia Domna, testemunha do crime fratricida, ainda manteve seu apoio ao governo de Caracala, sendo figura presente em sua corte e atuante como influente conselheira governativa.  

Além das perseguições, o governo de Caracala foi dedicado a campanhas militares agressivas nas fronteiras dos domínios romanos, enfrentando povos germânicos que viviam às margens do território do império. Invadir o território do Império Parta, que se estendia do Irã até regiões da Índia e China, era outra pretensão bélica de Caracala em busca de afirmar sua grandeza. Ele atraiu o imperador rival Artabano IV para uma falsa conciliação diplomática para facilitar uma ousada estratégia invasiva, então liderou suas legiões em uma grande incursão pelo território parta. Apesar de ter surpreendido Artabano IV e de ter causado estragos, os romanos não conseguiram avançar e precisaram pagar uma indenização quando Caracala já estava morto. Para consumar seus propósitos militares, o imperador aumentou consideravelmente os gastos com as tropas, com os salários e benefícios aos soldados, gerando uma forte pressão financeira e afetando a economia do império, resultando em inflação e falta de recursos para outras necessidades. Diante da situação, ele instituiu a “Constitutio Antoniniana”, lei que concedeu cidadania romana para todos os homens livres do império, medida que visava aumentar a arrecadação de impostos e obrigação com o serviço militar, mas os problemas internos e a insatisfação popular, da elite e dos persistentes adeptos de Geta eram indomáveis. 

O ambiente desfavorável para o imperador rejeitado pela população culminou com seu assassinato, em 217. Uma trama pelo poder e pela substituição do imperador já rondava como ameaça e contava com a influência do articulado Macrino, que era prefeito do pretório, cuja função era atuar como comandante da Guarda Pretoriana, supervisionar aspectos da administração pública e desempenhar funções judiciais. Caracala foi morto enquanto estava em Carras (atual Harran, na Turquia) durante a campanha contra a Pártia e seu assassino foi o soldado Martialis, motivado por fatores pessoais e políticos, que aproveitou um momento de vulnerabilidade do imperador. Três dias após o assassinato, os as tropas aclamaram Macrino como imperador.


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