Durante a Idade Média o controle do comando da Igreja Católica era um cenário de disputas intensas que refletiam articulações religiosas e mundanas. As pressões políticas e diplomáticas faziam parte do processo de definição das sucessões papais, envolvendo as elites aristocráticas e seus interesses, ocasionando conflitos e manobras pelo poder sobre a instituição religiosa. Os poderosos italianos construíram um forte vínculo com o papado e controlavam a corte dos cardeais através da nomeação de seus representantes, assegurando assim o domínio dos mecanismos de administração da Igreja e eleição dos pontífices, frequentemente recorrendo a métodos como o nepotismo e a negociação de cargos eclesiásticos decisivos.
Esta situação favorável aos italianos mudou temporariamente quando a nobreza francesa assumiu uma influência determinante, estabelecendo o Papado de Avignon (1309-1377), que os italianos criticaram como “Cativeiro Babilônico”. A crise geopolítica se estabeleceu quando Clemente V foi eleito papa, em 1305. O novo pontífice tinha origens francesas e decidiu que não iria governar a Igreja a partir de Roma, argumentando que o contexto italiano era instável e violento e preferindo instalar sua corte em Avignon, no território da França. Esta decisão contrariou as elites italianas, habituadas ao papado como uma instância de sua influência e instrumento de seu poder. Por outro lado, a mudança agradou a coroa francesa porque trouxe o papado para sua órbita de interferência política.
As divergências entre italianos e franceses dividiram os cristãos, pois envolveram aspectos das disputas diplomáticas e militares da época. A Inglaterra, que mantinha uma relação conflituosa com a França, acentuada em 1337 pelo início da Guerra dos Cem Anos, abordou a mudança com desconfiança, apesar de oficialmente apoiar o papado. No Sacro Império Romano-Germânico, que também tinha conflitos com a França, a preocupação era grande a respeito do eventual crescimento francês ocasionado pelo estabelecimento da sede da Igreja Católica em seus limites. Os ibéricos apoiaram a mudança porque já eram aliados da França desde antes disso e identificaram uma oportunidade de conseguir maior espaço no comando da instituição religiosa com a diminuição da presença dos italianos, embora muitos desconfiassem da crescente influência da monarquia francesa sobre a Igreja. Húngaros, poloneses e escandinavos, que já viviam à margem do poder diante da condução da Igreja Católica, assumiram uma posição neutra, embora não contestassem a autoridade dos papas franceses.
Além de Clemente V, que comandou a Igreja até 1314, os papas franceses ou subordinados aos interesses da França que exerceram o pontificado durante período foram João XXII (1316-1334), Bento XII (1334-1342), Clemente VI (1342-1352), Inocêncio VI (1352-1362), Urbano V (1362-1370) e Gregório XI (1370-1378). Durante os pontificados dos últimos deles ocorreram tentativas de restituir Roma como sede da Igreja e eles até chegaram a se estabelecer temporariamente no tradicional cento católico, sinal de que as pressões em favor dos italianos estavam cada vez mais firmes, prenunciando o surgimento de um novo cenário de crise que surgiu durante o pontificado de Urbano VI.
O italiano Bartolomeo Prignano, nascido por volta de 1318, se tornou sucessor de Gregório XI através de um processo tumultuado. Homem de sólida formação em teologia e em direito canônico, ele teve destaque exercendo funções administrativas, atuando em Nápoles e em Avignon, onde serviu como chanceler do Papa Gregório XI. Sua experiência e habilidade foram bastante consideradas em sua escolha como papa, em 1378, apesar do surpreendente fato de não ser um cardeal. Na ocasião do conclave que confirmou sua designação, ele exercia a função de arcebispo de Bari e a população italiana pressionava os cardeais pela indicação de um papa da Itália.
Depois de assumir o pontificado, Gregório XI revelou ser uma pessoa que não se sujeitava aos interesses dos cardeais, principalmente os franceses, demonstrando uma personalidade severa e autoritária. Ele confirmou o restabelecimento Roma como sede oficial da Igreja (feito realizado por seu sucessor no final de seu pontificado) mostrava-se inflexível diante das pressões dos representantes franceses na corte de cardeais, que decidiram contestar sua legitimidade sob a alegação de que ele foi eleito diante de pressões e ameaças dos italianos. Os cardeais divergentes resolveram promover um novo conclave, que indicou o diplomático e habilidoso cardeal Roberto de Genebra, assumindo a posição de papa sob o nome Clemente VII. A situação foi complexa. Os dois papas excomungaram um ao outro e falavam oficialmente em nome da Igreja, cada um seguido por seus cardeais apoiadores. Clemente VII fixou a sede de seu pontificado em Avignon e proclamava seus atos desconsiderando a existência do pontífice estabelecido em Roma. A situação estabelecida pelo ato de nomeação de um segundo papa ficou conhecida como Grande Cisma do Ocidente e perdurou de 1378 até 1417.
A existência de um papa e de um antipapa causou perturbações. A situação de dois (ou mais) pontífices que reivindicaram o comando da Igreja já havia ocorrido em crises anteriores e exemplificavam a complexidade das relações políticas na estrutura da poderosa instituição religiosa. No caso do Grande Cisma do Ocidente, os dois lados afirmavam possuir legitimidade enquanto questionavam a posição oposta. Os papas rivais tinham também seus aliados na Europa Católica. Urbano VI foi apoiado pela Inglaterra, pela Hungria, pela Polônia e partes da Alemanha e da Itália, enquanto Clemente VII era reconhecido na França, na Escócia, nos reinos ibéricos de Castela e Aragão e até mesmo em regiões da própria Itália.
Em Roma, a reação de Urbano VI contra seus opositores foi veemente. Ele ordenou prisões, torturas e execuções de pessoas acusadas de participação em uma trama para promover sua deposição. Seu temperamento furioso era visto como “insano” por parte de seus críticos e reforçava a oposição dos dissidentes. Ele morreu aos 71 anos de idade em 1389 e as circunstâncias da morte são controversas, havendo a versão de que ele não resistiu às sequelas físicas de uma queda sofrida no ano anterior durante uma expedição militar ou que ele acabou envenenado. Após sua morte, a divisão da igreja sediada em Roma promoveu outra transição tumultuada, pois não foi aceita a autoridade Clemente VII como pontífice para ocupar a vacância romana e Bonifácio IX foi eleito para continuar a defender a legitimidade de seu lado na disputa entre papas.
O Grande Cisma do Ocidente prevaleceu até 1417, quando Concílio de Constança depôs os últimos papas divergentes e elevou Martinho V como pontífice que reunificou a Igreja Católica.
Referências:


[…] O pontificado de Urbano VI, iniciado em 1378, foi marcado pelo início do Grande Cisma do Ocidente, uma das maiores crises da Igreja Católica. Após sua eleição controversa, com forte pressão dos italianos, a oposição francesa nomeou um segundo papa, Clemente VII, dividindo a Igreja entre Roma e Avignon. As excomunhões mútuas e a luta pelo poder eclesiástico levaram a décadas de conflito, com reis e países apoiando lados opostos. Conheça os detalhes dessa divisão que abalou a Igreja por quase 40 anos. […]