Joana I de Castela: Louca ou vítima de uma conspiração?

(Representação virual gerada pelas IAs Midjourney e Leonardo)

Histórias idealizadas de princesas felizes encantam, mas Joana de Castela não foi uma delas. Filha de Fernando II de Aragão e Isabel I de Castela, os Reis Católicos que integraram a Espanha, ela nasceu em 1479 na cidade de Toledo. A princesa estava destinada aos privilégios da alta nobreza sem muitas expectativas de pressões ou responsabilidades, sendo a terceira filha do casal real, mas a desventura de Joana começou quando seus irmãos mais velhos morreram e ela passou a ser a sucessora oficial dos tronos de Castela e de Aragão. 

Como era costume da realeza, a jovem princesa virou uma peça no complexo cenário das relações internacionais. Através de uma aliança política articulada por diplomatas da corte e monarcas objetivando o atendimento de interesses em comum, assim foi arranjado o seu matrimônio com Filipe, o Belo, arquiduque da Áustria e duque de Borgonha, filho do imperador Maximiliano I do Sacro Império Romano-Germânico e de Maria de Borgonha. A união representava um acordo político muito importante, pois relacionava o reino espanhol ao poder da Dinastia Habsburgo. O casamento ocorreu em 1496, quando ela tinha 16 anos, e depois de viver um período afastada do marido, ela foi liberada pelos pais para morar em Flandres.

A vida afastada de sua terra natal e de seus familiares não era fácil. Joana não conseguia se adaptar aos diferentes costumes e relações na corte dos Habsburgo, não falava o idioma local nem interagia com muitas pessoas, o que afetou bastante seu estado emocional. Além disso, a vida conjugal não estava sendo como a princesa espanhola esperava. Muito apaixonada pelo marido, Joana cumpriu logo o que se esperava a respeito da garantia da continuidade da dinastia e teve filhos seguidos, incluindo Carlos I da Espanha (também conhecido como Carlos V do Sacro Império Romano-Germânico). Apesar de sua devoção até obsessiva ao marido, ele não demonstrava o mesmo apreço por sua esposa e mantinha amantes explicitamente, situação que abalava ainda mais os sentimentos da princesa, que se isolava cada vez mais no decorrer dos anos, manifestando reações de ciúmes e sendo acusada de apresentar um comportamento errático, virando assunto na corte e gerando rumores a respeito de sua sanidade mental. 

Quando Isabel I morreu, em 1504, a regra da sucessão estabelecia que Joana deveria ocupar o posto de rainha de Castela, como era desejo de sua mãe, que antes de morrer insistia no retorno da herdeira para a Espanha com receio de que Filipe usurpasse seu direito sucessório. Acordos chegaram a ser discutidos para negociar quem deveria governar, causando instabilidade e dúvidas a respeito do futuro do reino.

Em 1506 ocorreu a morte de Filipe enquanto Joana esperava seu sexto filho, o que representou outro forte golpe em sua vida. Apesar dos sofrimentos sentidos durante o tempo do casamento, a rainha Joana I de Castela desenvolveu um estado profundo de luto que proporcionou uma depressão severa e agravou sua abalada condição emocional, já afetada por uma série de circunstâncias familiares. Foi reforçado publicamente que ela estava incapacitada para exercer o poder, considerando que seu comportamento e humores inviabilizaram o cumprimento das responsabilidades exigidas de uma nobre em sua posição. Diante da situação, o usurpador acabou sendo seu próprio pai, o rei Fernando II de Aragão, que impediu que a filha assumisse o poder em seu próprio nome. O monarca interferiu no processo, se impondo como regente, fazendo dela uma rainha sem autoridade efetiva.

Entre o quadro que era exposto, Joana era apresentada como uma pessoa irreversivelmente comprometida, pois foi alegado que ela não se alimentava, não cuidava de sua própria higiene, repelia a aproximação das pessoas e se comunicava de maneira desconexa, dando ao pai a justificativa de ordenar seu confinamento no Palácio de Tordesilhas, em 1509. Afastada definitivamente da corte, a rainha destronada vivia sob a vigilância de serviçais e agentes do reino e, apesar de seu status como figura da realeza, era tratada de maneira severa e até degradante. Nas condições de seu confinamento, até sua falta de interesse pelas rotinas religiosas foi tratada de maneira abusiva. Seu afastamento foi mantido sob o reinado do filho, Carlos I, e ela acabou passando 46 anos de sua vida como uma pessoa isolada do convívio social, presa permanentemente, omitida e abandonada pela própria família real. 

Joana I morreu em 1555, aos 75 anos de idade. Ela recebeu o apelido pejorativo de Joana, a Louca. Durante o século XIX, autores românticos passaram a se interessar por sua história, retratando a rainha de uma forma diferente, justificando sua eventual loucura como um efeito trágico de uma verdadeira devoção amorosa dramática.

Diversos historiadores interpretam que sua “loucura” foi uma alegação sustentada em exageros e utilizada para a efetivação de uma conspiração por poder, sabotando seu legítimo direito ao trono.


Referências:

Um comentário

Os comentários estão fechados.