Em 1792, durante a fase da Revolução Francesa dominada pelos Jacobinos, tendência radicalizada sob o comando de Maximilien Robespierre, foi estabelecida uma postura autoritária e marcada pela violência que ficou conhecida como “O Terror”. As massas populares eram constantemente mobilizadas através de conclamações eloquentes proporcionadas pelos agentes do Comitê de Salvação Pública, que era a estrutura governamental revolucionária instituída como entidade governativa. Outros entusiastas da via extremista adotada pelo comando revolucionário também atuavam na incitação das pessoas, a exemplo de Jean-Paul Marat, que editava o do jornal político “L’Ami du Peuple” (O Amigo do Povo). Marat era notório defensor das execuções dos críticos do regime estabelecido e pregava abertamente ainda mais extermínio, chegando a publicar em seu jornal as identidades de pessoas que ele julgava merecedoras de um fim trágico na guilhotina. Por essas razões, não faltava quem considerasse Marat um indivíduo extremamente perigoso que deveria ser silenciado definitivamente e a jovem Charlotte Corday resolveu encarar esta missão.
Nascida em Écorches, na Normandia, em 1768, Charlotte Corday fazia parte de uma família de privilegiadas condições. Aos 13 anos, após a morte da mãe, foi enviada pelo pai para um convento em Caen, mas as leituras religiosas não atraíram a atenção da jovem tanto quanto os textos de Rousseau e Voltaire. Depois que a revolução eclodiu, a situação na região ficou bastante agitada e o até o convento foi fechado. Charlotte foi viver com uma tia, Madame Le Coustellier de Bretteville-Gouville, que morava na cidade, e a experiência fora do recinto religioso proporcionou um envolvimento ainda maior com os ideais iluministas e causas como justiça social e liberdade. Ela se alinhou aos Girondinos, defendendo transformações progressivas sem extremismos e violência.
Charlotte ficou ainda mais alarmada com a situação de violência depois dos conhecidos “Massacres de Setembro”, ocorridos em 1792. Numa demonstração de força e visando conter as resistências internas, o comando revolucionário motivou entre os dias 2 e 6 mais de mil execuções de presos políticos, condenados por traição sem direito a defesa. Muitos entusiastas radicais participaram da matança, invadindo as prisões para consumar os assassinatos e Marat foi um dos incentivadores deste ativismo violento.
Enquanto isso, Charlotte atuava politicamente em Caen, integrada aos girondinos que fugiram das perseguições em Paris. Ela participava de reuniões, debates de ideias e promovia a divulgação de princípios políticos.
Sua convicção não foi abalada quando o Reinado do Terror foi implantado, então ela decidiu agir por iniciativa própria contra aquele que identificava como um importante promotor da carnificina política. Ela foi para Paris determinada a matar Marat e tinha um plano a seguir. Se hospedou em um hotel e se concentrou na escrita de seu manifesto e testamento político “Adresse aux Français amis des lois et de la paix” (“Discurso aos Franceses amigos das leis e da paz”), no qual apresentava a justificativa do ato que estava prestes a realizar. Charlotte afirmou que a o assassinato de Marat era necessário e ao cumprir o homicídio ela estaria prestando um serviço ao país e salvaria a república recém proclamada. Ela expressou sua condenação ao direcionamento violento da Revolução e tinha consciência de que seria posteriormente capturada e executada, mas sua disposição agir pela causa da paz estavam acima de seu apego à própria vida. A esperança final era de que seu ato de sacrifício inspiraria a luta contra a tirania.
Seu ato premeditado considerava um atentado fatal contra Marat em um ambiente público em plana sessão da Convenção Nacional. Para sua frustração, ela descobriu que seu alvo estava confinado em casa por causa de sua doença de pele, que o obrigava a passar horas dentro da banheira para poder suportar os transtornos de sua condição. Ela resolveu adaptar sua estratégia e foi até a residência de Marat em 13 de julho de 1793, se apresentando como uma simpatizante que tinha informações sobre supostos traidores da revolução. Depois de bastante insistência, ela conseguiu convencer a irmã e a noiva de seu alvo, que atuavam como assessoras de Marat, a admitirem seu acesso ao recinto no qual ele estava. Ao se deparar com aquele que estava prestes a matar, ela manteve o fingimento e citou nomes falsos que Marat anotava, então, aproveitando-se da situação, golpeou o incitador de execuções com uma faca que levou consigo.
Charlotte Corday foi detida no próprio local do crime e prontamente enviada para as autoridades. Ela foi firme ao expor suas motivações e declarou que agiu por conta própria. Antes de ser executada na guilhotina, quatro dias após o assassinato, teria proferido suas últimas palavras: “Eu matei um homem para salvar cem mil”. Ela tinha 24 anos de idade.
Contrariando os objetivos e idealizações de Charlotte, a morte de Marat não reduziu a sangrenta atuação do Comitê de Salvação Pública. O agitador político assassinado foi elevado à condição de mártir pelos jacobinos, que tomaram o ato como motivo para intensificar ainda mais a violência. Mesmo tendo agido por conta própria, Charlotte colocou os girondinos em uma situação complicada, pois passaram a ser ainda mais perseguidos, com muitos deles executados pelo Reinado do Terror. O extremismo sanguinário dos jacobinos foi tão intenso que seus mais inflamados líderes logo passaram a se voltar contra adeptos do próprio grupo, inviabilizando o regime que criaram.
Referências:


[…] em sua banheira. Foi nesta condição que em 13 de julho de 1793 apareceu diante dele a jovem Charlotte Corday, que inicialmente anunciou como que tinha informações, mas tal justificativa era um pretexto para […]
[…] Charlotte Corday: A Mulher que Tentou Mudar o Curso da Revolução Francesa […]