O perturbador caso do Vampiro de Montparnasse

Comportamentos bizarros associados a crimes perturbadores sempre chocaram as sociedades e despertaram, além de repulsa, a necessidade de compreender ainda mais as possibilidades da mente humana em condições patológicas. O caso do francês François Bertrand é um exemplo dessa situação.

Bertrand nasceu em 1823 e logo cedo percebeu-se que havia algo diferente em seu comportamento. Quando menino, ele apresentou um fascínio mórbido por animais mortos e pela prática de dissecar cadáveres de cães e gatos. Apesar disso, ele levou uma vida aparentemente normal em outros aspectos de seu cotidiano, chegando a estudar normalmente e a conseguir ingressar na vida militar depois de crescido. No exército, ele serviu como um dedicado e disciplinado soldado, respeitado pelos companheiros de corporação.

Até então ninguém desconfiava que o sargento Bertrand era atormentado por dores de cabeça incontroláveis e palpitações cardíacas que só cessavam quando ele realizava seus impulsos mórbidos e sinistros. Incapaz de resistir, ele saía de casa durante as madrugadas, invadia cemitérios e procurava túmulos com sepultamentos recentes para desenterrar os defuntos e praticar atos inomináveis com os mortos. Ele mutilava, praticava evisceração, frequentemente passava um tempo abraçado a jovens cadáveres femininos antes de realizava atos sexuais.

Ele violou sepulturas e profanou corpos nos cemitérios parisienses de Montmartre, Père Lachaise e, principalmente, no de Montparnasse nos anos de 1848 e 1849. Durante as manhãs após suas visitas sombrias, os funcionários dos cemitérios chegavam para serviço se deparavam com cenas estarrecedoras. Era comum que Bertrand atacasse várias sepulturas em uma noite, o que alarmava ainda mais a cidade. A discrição do soturno invasor foi capaz de superar os cuidados com o reforço da vigilância nas principais necrópoles de Paris, possibilitando sua continuada atuação.

Os mais engenhosos coveiros apelaram para métodos alternativos, como a montagem de armadilhas em sepulturas falsas ou vazias especialmente preparadas para atrair o violador macabro. Bertrand finalmente acabou ferido em um artefato montado em uma cova, mas ainda conseguiu escapar e procurou o hospital militar de Val-de-Grâce para tratar dos ferimentos causados pela armadinha. Durante seu internamento, um médico desconfiado resolveu averiguar a situação ao notar lesões mais antigas em Bertrand, que costumava cavar as sepulturas com as próprias mãos, o que ocasionou desgastes na pele e pequenos ferimentos. O paciente relatou sem sofrer pensões como obteve as feridas e as autoridades foram acionadas.

François Bertrand detalhou espontaneamente suas práticas e impulsos durante os depoimentos, o que gerou enorme choque através da repercussão pública do caso. A comunidade médica também se interessou pala situação e especialistas avaliaram atentamente os episódios e relatos do acusado. Os médicos concluíram que Bertrand sofria de um distúrbio que qualificaram como “monomania”, um transtorno que faz o indivíduo recorrer a um comportamento obsessivo sem capacidade de controle.

A falta de parâmetros legais para a qualificação dos crimes e avaliação médica podem ter favorecido o julgamento daquele que a imprensa qualificou como “Vampiro de Montparnasse”. Ele foi condenado a cumprir apenas um ano de prisão, apesar dos protestos que exigiam um castigo severo diante da atrocidade dos atos. Depois de liberado, François Bertrand passou a levar uma vida discreta no anonimato, chegando a trabalhar como escriturário, carteiro e vigilante. Ele morreu em 1878, aos 54 anos de idade.

O caso médico motivou o aperfeiçoamento dos estudos comportamentais. Em 1850, o psiquiatra Joseph Guislain elaborou o conceito de “necrofilia” como distúrbio que proporciona uma atração sexual pelos incontrolável por cadáveres. O doutor Guislain examinou cientificamente os depoimentos de Bertrand para formular suas teses.


Referências: