Júlio II, o Papa Guerreiro

(Representação visual gerada pela IA Leonardo)

A transição entre os séculos XV e XVI ocorreu em contexto complexo para a Europa. Era tempo do Renascimento, que ampliou horizontes para o pensamento, ciência e expressão artística, as navegações conectaram povos e lugares distantes e revelaram até um Novo Mundo de um imenso continente que os europeus não conheciam, enquanto as atividades mercantis geravam fortunas para a burguesia sedenta por poder. Reis ampliavam o controle absoluto sobre seus domínios através da força e dos confrontos que se transformavam em guerras. A religiosidade também experimentou transformações através das contestações dos reformistas e das questões internas da Igreja Católica, instituição envolvida direta ou indiretamente em praticamente todas as esferas e ambientes de um período histórico muito agitado.

Um dos personagens mais marcantes daquele tempo foi Giuliano della Rovere, que se tornou o Papa Júlio II. Ele nasceu em 5 de dezembro de 1443, na cidade de Albisola, pertencente à República de Gênova. Seus pais foram Raffaelo della Rovere e Theodora Manerola, que, apesar das origens nobres, não tinham fortuna nem prestígio social. A carreira eclesiástica acabou virando uma alternativa para Giuliano e ele contou com o apoio do tio, Francesco della Rovere, clérigo da Ordem dos Franciscanos e que se tornou papa em 1471, sob o nome Sisto IV. Sendo favorecido pelo papa, Giuliano foi nomeado cardeal aos 27 anos de idade e ocupou com destaque importantes cargos eclesiásticos e funções diplomáticas, acumulando experiência e consolidando relações estratégicas com personalidades importantes.

Quando seu tio morreu, em 1484, ele recusou apoio a Rodrigo Borgia, que acabou sendo escolhido como Papa Alexandre VI. Seu posicionamento teve repercussão, pois o novo pontífice tratou de retaliar Giuliano, que se viu obrigado a buscar refúgio na corte de Carlos VIII, rei da França e oponente de Alexandre VI. O cardeal apoiou a campanha militar do rei francês contra a Itália e permaneceu atuando numa frente contrária ao pontífice. Depois da morte do papa, em 1503, ele retornou para a Itália e conseguiu, no mesmo ano, ser eleito para chefiar a Igreja após o curtíssimo pontificado de Pio III.

Reconhecido como o “Papa Guerreiro”, Júlio II dedicou muita atenção aos assuntos militares. Ele assumiu diretamente o papel de comandante de seu exército, composto por mercenários e pela recém-criada Guarda Suíça, que ele estabeleceu em 1506 como uma força militar da própria Igreja Católica e inicialmente integrada por combatentes altamente treinados e disciplinados. O papa também incorporou ao contingente soldados fornecidos pelos aliados, formando a Liga de Cambrai com apoio da França, Espanha e Sacro Império Romano-Germânico. Seu objetivo era assegurar a retomada de territórios papais que foram dominados principalmente pela República de Veneza e estabilizar a fragmentada Itália através da força. Neste cenário de relações sujeitas a constantes mudanças, pois inimigos e aliados de uma ocasião mudavam de posições em outros cenários, então as guerras de Júlio II eram sujeitas a ajustes. Ele formou e liderou outra coalizão, a Santa Liga, dessa vez ao lado dos venezianos, ingleses e espanhois contra os antigos aliados franceses, que se aproveitaram dos conflitos anteriores para ocupar regiões italianas. 

O papa adquiriu as habilidades de comando militar enquanto atuava em suas missões diplomáticas e se aprofundava a respeito das complexas conexões e contextos das relações entre as nações europeias. Ele era dotado de qualidades como negociador, articulador e estrategista, mas não se limitava a agir nos bastidores ou nas cúpulas das tomadas de decisões, pois liderava pessoalmente suas tropas nos campos de batalha em suas vitoriosas campanhas bélicas. 

Além de sua atuação como líder militar e senhor da guerra, Júlio II também travou suas lutas dentro da estrutura da Igreja Católica, reformulando importantes aspectos administrativos da poderosa instituição religiosa, incluindo medidas para conter a prática de simonia, que era a venda de cargos eclesiásticos que incluía negociações financeiras para obter votos nas eleições papais. Ele convocou o Concílio de Latrão V, em 1512, para promover medidas de afirmação da autoridade da Igreja, permitiu o indiscriminado processo de venda de indulgências para arrecadar fundos e financiar a construção da Basílica de São Pedro e autorizou a instalação de dioceses no territórios coloniais que começavam a ser explorados por espanhois e portugueses. 

Júlio II foi um notável apoiador da arte renascentista, patrocinando artistas e oportunizando o trabalho de gênios como Michelangelo, Rafael, entre outros. Os mestres das artes atuaram nas construções e decorações que fizeram parte do legado arquitetônico promovido durante o pontificado. 

O final do comando de Júlio II sobre a Igreja Católica ocorreu por ocasião de sua morte, em 1513. O conclave que se seguiu elegeu o cardeal Giovanni de’ Medici, nomeado Papa Leão X. Apesar de ser rival de seu antecessor, o novo papa deu continuidade a muitas das iniciativas que foram iniciadas por Júlio II.


Referências:

3 comentários

  1. […] Conhecido como o “Papa Guerreiro”, Júlio II não se limitou aos assuntos espirituais. Ele comandou exércitos, fundou a Guarda Suíça e liderou a Liga de Cambrai em guerras pela retomada de territórios. Além de suas vitórias militares, foi um grande mecenas das artes, patrocinando Michelangelo e Rafael. Sob sua liderança, a Igreja Católica passou por reformas e enfrentou tensões políticas e religiosas que definiram uma era. Descubra como Júlio II moldou o papado com sua estratégia e ambição! […]

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