Papa João XII: Devassidão, corrupção e conflitos durante um dos piores pontificados da Igreja Católica

(Representação visual gerada pela IA Leonardo)

Durante a Idade Média, os processos de definição dos líderes da Igreja Católica foram frequentemente marcados por polêmicas, extravagâncias e arbitrariedades, sobretudo durante o período compreendido entre os séculos IX e XI. Nesta fase complexa, o século X foi especialmente crítico, sendo destacado como “Saeculum Obscurum”, quando prevaleceu um contexto de franca corrupção e imoralidade no papado. Interesses políticos acima das questões espirituais geraram conflitos intensos, degradação institucional e descrédito da liderança de pontífices envolvidos em diversos escândalos. Enriquecimento ilícito, luxúria e assassinatos viraram práticas regulares no papado.

Um dos papas mais polêmicos do período foi João XII, conduzido ao posto de chefe da Igreja com apenas 18 anos de idade. Ele era filho único de Alberico II de Spoleto, governante de Roma. O jovem papa vinha de uma linhagem de poderosos que realizavam fortes interferências nos assuntos da igreja, sendo neto da infame Marozia, uma mulher da nobreza italiana que durante anos dominou o comando do alto clero através de envolvimentos políticos e sexuais com papas, num cenário que foi qualificado por seus críticos como “Pornocracia”.

Nascido Otaviano, em 937, seu destino foi traçado e articulado pelo pai, que assegurou o ingresso de seu herdeiro no clero para garantir o controle da igreja e fortalecer o poder político e econômico da família. Ainda na adolescência, Otaviano foi designado cardeal como estratégia para proporcionar sua eventual eleição para o cargo máximo da instituição religiosa. Alberico II garantiu o apoio comprando votos dos membros da corte da igreja, o que resultou em sua fácil condução ao pontificado em 955, após a morte do papa Agapeto I. Ao assumir o comando sobre os católicos no final do mesmo ano, o novo pontífice escolheu o nome João XII e iniciou uma gestão catastrófica da igreja romana.

Sem qualquer vocação religiosa, o jovem papa demonstrava ter pouco conhecimento teológico e muita disposição para práticas mundanas. O Palácio de Latrão, então sede da Igreja Católica, foi transformado em sua área pessoal para os prazeres carnais, pois ele promoveu frequentes farras e orgias, chamando a atenção para o notável nível de devassidão que marcou sua passagem pelo pontificado. João XII também ficou conhecido pelos casos mantidos com mulheres casadas e pelos abusos sexuais praticados contra peregrinas que eram mantidas à força sob seu domínio. O comportamento reprovável do papa era marcado por bebedeiras e frequentes participações em caçadas, o que o afastava de suas funções com regularidade.

João XII também usava sua posição para obter vantagens materiais, negociando cargos eclesiásticos e arrecadando propinas. As práticas eram tão descaradas que ele chegou a nomear como bisco um menino de 10 porque recebeu um pagamento pelo favorecimento, uma conduta corrupta conhecida como simonia. Cardeais que não admitiam o comportamento e as decisões de João XII questionavam sua regência sobre a igreja e até condenavam seu caráter, denunciando abusos e práticas incorretas.

Não faltavam acusações das mais diversas irregularidades e a situação finalmente acabou escandalizando rei germânico Otão I, que o próprio João XII coroou como restaurador do Sacro Império Romano-Germânico. O imperador e o papa formaram inicialmente uma aliança, pois Otão I pretendia contar com o apoio legitimador de João XII para ser proclamado imperador e o papa queria sua proteção militar contra as ameaças dos inimigos italianos. A má conduta do chefe da igreja extrapolou os limites até conforme o discernimento monarca, então Otão I resolveu atender aos clamores dos cardeais que defendiam a integridade institucional do catolicismo ou que apenas eram politicamente opositores de João XII. Um sínodo foi convocado em 963 para deliberar sobre a situação comprometedora da Igreja Católica sob um pontificado vexatório, resultando em sua deposição.

Apesar da deposição e de todos os motivos exposto para justificar sua queda, João XII conseguiu voltar ao poder pouco tempo depois através de uma articulação que contou com o envolvimento ativo de opositores ao sacro imperador. O retorno foi breve, pois ele acabou morrendo em maio de 964, aos 27 anos de idade. A circunstância da morte foi misteriosa, pois sua causa foi uma grave lesão na cabeça. Suspeitas e especulações sugerem que ele pode ter sido assassinado pelo marido de uma de suas amantes, atingido durante uma briga por outra razão ou até mesmo sofrendo uma queda fatal durante uma circunstância comprometedora.

João XII foi substituído por Leão VIII, que tentou salvar a reputação da Igreja Católica com o apoio de Otão I.


Referências: