François Poullain de la Barre (1648-1723) foi um pensador sobre o qual poucos detalhes são conhecidos a respeito de sua vida. Ele era de família francesa abastada e teve o privilégio de obter uma formação elevada, formando-se em teologia na prestigiada Universidade de Sorbonne, em Paris. Ele chegou a atuar na vida eclesiástica na Igreja Católica, mas suas ideias não combinavam com a instituição. Abandonou a vida clerical, foi embora para a Suíça e por lá se casou e viveu como professor e escritor.
Foi seguidor de Descartes, com quem aprendeu a valorizar a atitude duvidar e questionar como providência fundamental para alcançar a verdade. Diante desta relação com o conhecimento, Poullain de la Barre concluiu que a noção de superioridade masculina era uma crença questionável e não preenchia os requisitos para validação como uma certeza absoluta.
O filósofo foi um importante feminista numa época em que mulheres não conseguiam ter espaço ou voz para estabelecer suas ideias e críticas à submissão. Em 1672 ele publicou “Sobre a igualdade dos dois sexos” (“l’égalité des deux sexes”), depois, em 1673, “Sobre a Educação das Mulheres” (“De l’éducation des dames”) e, no ano seguinte, “Sobre a excelência dos homens” (“De l’excellence des hommes”). Nesta sequência de obras ele salientou que não existem diferenças essenciais entre homens e mulheres, enfatizando que as desigualdades eram baseadas em preconceitos históricos que não refletiam a natureza intrínseca de entre os gêneros. Poullain de la Barre argumentava que homens e mulheres são mentalmente e fisicamente semelhantes em todos os aspectos relevantes, e, portanto, deveriam ser considerados iguais.
Além de outras circunstâncias sociais, ele justificava que a educação até então praticada era um dos fatores da desigualdade. Como homens e mulheres são dotados das mesmas capacidades, o acesso à instrução e o modo como os comportamentos e normas eram instituídos e difundidos acabaram sendo empregados de forma desfavorável para as mulheres. Ele defendia a igualdade de acesso à educação, criticando a educação limitada e insuficiente que era oferecida às mulheres da época. O pensador argumentava que a “falta de habilidades cognitivas” em mulheres era resultado das condições em que viviam e da educação inadequada que recebiam.
Poullain de la Barre propunha uma educação ideal, baseada em um método rigoroso, que enfatizasse a igualdade de oportunidades entre os sexos. Deste modo, a educação era uma forma de libertar os indivíduos do preconceito e da subjugação, proporcionando-lhes o conhecimento necessário para se conhecerem verdadeiramente. Ele acreditava que o conhecimento de si mesmo era fundamental para abordar adequadamente a igualdade de gênero.
Nos idos do século XVII estas ideias eram perturbadoras. Poullain de la Barre defendeu que “o espírito não tem sexo” em uma sociedade claramente marcada pela noção de que a desigualdade era legítima, natural, necessária e até baseada em parâmetros religiosos. Sua defesa da igualdade questionava a ordem social estabelecida. A proposta de uma educação igualitária contrariava a prática da instrução excludente vigente em sua época, sobretudo diante da possibilidade de que as mulheres pudessem questionar seus papeis subordinados na sociedade.
De um modo geral, embora não tenham passado despercebidas, as ideias de Poullain de la Barre foram recebidas com ceticismo até entre progressistas contemporâneos e suas obras tiveram uma circulação limitada também afetada pela censura, não conseguindo atingir imediatamente muitos seguidores. Nos séculos XVIII e XIX escritoras que encararam as polêmicas em torno da discussão sobre as condições femininas citavam suas contribuições filosóficas em favor da igualdade, a exemplo da feminista britânica Mary Wollstonecraft, que baseou parte de sua argumentação no trabalho do pensador francês.
Embora as ideias de Poullain de la Barre não tenham sido amplamente aceitas durante sua vida, elas plantaram sementes importantes para o futuro desenvolvimento do feminismo. Com o passar do tempo seu trabalho foi redescoberto e valorizado por sua contribuição pioneira à igualdade de gênero.
Referências:

