O médico contrário à pena de morte que deu nome à mortal guilhotina

(Representação visual gerada pelas IAs Midjourney e Leonardo)

Paris, 25 de abril de 1792. Um criminoso condenado é acompanhado até o local do cumprimento de sua sentença na Place de Grève. O bandido que praticava assaltos nas estradas inaugurou uma nova era na aplicação da pena de morte na França, sendo a primeira vítima da guilhotina, dispositivo dotado de uma lâmina pesada e afiada que caía cortante e fatalmente sobre o pescoço da pessoa condenada, causando uma morte instantânea. Depois dele, milhares de condenados encontrariam o mesmo destino. Eram tempos de revolução na França.

A inovação mortífera foi introduzida no sistema penal francês por influência de um homem que abominava a pena de morte e dedicou sua carreira ao salvamento de vidas como médico e como ativista pela ampliação do atendimento à saúde da população. Joseph-Ignace Guillotin (1738-1814), que teve até seu nome associado ao aparato, tinha respeitável atuação na medicina, uma visão progressista e ideais a respeito de políticas de saúde pública.

Em 1789 foi eleito para integrar a Assembleia Nacional Constituinte. Era bastante propositivo diante das demandas voltadas para a saúde e ciência e integrou o Comitê de Pobreza, que realizou levantamentos a respeito das condições do principal hospital da França. Os representantes da sociedade que atuavam na função legislativa durante aquele contexto de mudanças deliberavam sobre diversos temas, incluindo a aplicação da pena de morte. Guillotin propôs a adoção de um método que atenuasse a prática brutal das execuções que envolviam sofrimento físico. Além disso, não era incomum que ocorressem falhas na aplicação das habituais medidas empregadas – a forca e a decapitação por meio de machado – que resultavam no prolongamento da conclusão da operação, proporcionando um suplício adicional à pessoa executada. O doutor foi convincente ao esclarecer que, apesar de sua contrariedade sobre a pena de morte, o compromisso da revolução com princípios transformadores deveria considerar a aplicação de uma execução considerada mais adequada e humanitária, recorrendo a um método rápido, eficaz e moderno.

Guillotin não inventou o dispositivo, pois já existiam protótipos renascentistas e até a prática com uma estrutura semelhante, a “Scottish Maiden”, utilizada desde o século XVI na Escócia. A aprovação da lei proporcionou a adoção do equipamento mortal e um modelo aprimorado foi projetado pelo engenheiro Tobias Schmidt e o médico Antoine Louis.

Com o andamento do movimento político e de sua radicalização, a máquina mortífera revolucionária foi amplamente utilizada, virando um símbolo da carnificina, sobretudo durante o período do Terror (1793-1794). Joseph Guillotin ficou transtornado com a situação da infame guilhotina, que os entusiastas de sua utilização apelidaram de “La Veuve” (“A Viúva”).

O doutor Guillotin morreu de causas naturais em 1814, aos 75 anos de idade, mas a guilhotina seguiu vívida na França até 1977, quando foi utilizada pela última vez.


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