Akhenaton, o revolucionário faraó destruidor de deuses

(Representação visual gerada pela IA Midjourney)

Durante a fase conhecida como Novo Império (entre 1550 a.C a 1070 a.C) o Egito conheceu seu apogeu, época de expansão territorial, hegemonia imperialista e militar, quando alguns dos mais notáveis faraós regeram esta civilização marcante. É desta fase a vigência da 18ª dinastia faraônica (de 1550 a.C. a 1292 a.C.), iniciada por Ahmose I, faraó em cuja regência ocorreu a expulsão de invasores e a restauração do poder que foi seriamente comprometido pela fragilidade militar da fase anterior. Daí em diante figuras como a faraó Hatshepsut, a mulher mais poderosa que o Egito já conheceu, além do conquistador Tutmés III (o “Napoleão do Egito Antigo”) e o faraó construtor Amenhotep III guiaram o Egito com firmeza e segurança até que Amenhotep IV (posteriormente conhecido como Akhenaton) surgiu e provocou abalos radicais no poderoso império africano.

Por ocasião da ascensão de Amenhotep IV ao poder os sacerdotes detinham uma influência considerável, rivalizando em certos aspectos com o próprio faraó. O clero de Amon-Rá, em particular, havia acumulado riqueza e autoridade significativa e seus templos não eram apenas centros espirituais, mas também núcleos de poder econômico e político, controlando terras extensas e recursos. O culto à Amon-Rá (sincretismo das antigas divindades Amon e Rá) passou a ter primazia mesmo sobre os demais inúmeros deuses cultuados no Egito durante o Novo Império, o que conferia ao clero condições privilegiadas de exercício de poder através da vinculação divina, situação que passou a incomodar o novo faraó, embora as tensões já fossem sentidas nos tempos de seus antecessores. Mas Amenhotep IV tinha uma saída ousada e radical para neutralizar o poder sacerdotal mesmo tendo iniciado seu reinado seguindo as tradições estabelecidas.

A revolução religiosa e institucional empreendida por Amenhotep IV foi um programa complexo e extremo de transformações, pois o faraó resolveu implantar o monoteísmo centrado no deus Aton, representado pelo disco solar. A mudança teológica renegou uma quantidade de divindades difícil de ser determinada em função da complexidade do arranjo politeísta egípcio, que incluía deuses em gradações e hierarquias variáveis, além de adorações locais e expressões de sincretismo insondáveis de tão diversificadas. A dificuldade de assimilação de tamanha mudança e as reações contrárias foram consequência imediatamente verificadas, mas o faraó estava determinado a seguir adiante e até mudou seu nome para enfatizar a firmeza de seu objetivo, passando ser chamar Akhenaton, que tem um significado simbólico profundo como “Agradável a Aton”, sendo ele o único intermediário legítimo entre os homens e o supremo deus solar.

Templos foram fechados e suas propriedades foram tomadas, sacerdotes resistentes foram perseguidos e novas liturgias foram estabelecidas durante a ruptura promovida por Akhenaton. A capital do império foi estabelecida na cidade que também se chamava Akhenaton (e que mais tarde passou a ser chamada de Amarna), sede política, administrativa e religiosa do império. 

Embora o faraó revolucionário tivesse sua base de apoiadores, não foi fácil suplantar a tradição que foi desafiada e em governos regionais, esferas militares e no meio sacerdotal foram formados duros obstáculos para a evolução das mudanças, que Akhenaton não foi capaz de promover plenamente ao longo dos 17 anos de seu reinado (1353 a.C. a 1336 a.C.). Revoltas sociais completaram o quadro de instabilidades que vigorou durante o reinado do faraó que pretendeu romper com estruturas solidificadas na cultura egípcia.

Além do faraó, teve enorme destaque durante esta fase agitada a figura da rainha Nefertiti, principal esposa de Akhenaton. Uma das mulheres mais famosas do Mundo Antigo, de beleza e influência reconhecidas, Nefertiti pode ter sido também governante ao lado do marido e tiveram cinco filhas, incluindo a futura rainha Ankhesenamon, que herdou dos pais um ímpeto desafiador e também causou abalos no poder egípcio. Contudo, o sucessor de Akhenaton como detentor do papel de faraó foi Tutancâmon, seu filho com uma esposa secundária identificada como Kiya.

Após a morte de Akhenaton ocorreu a reversão de suas medidas e o politeísmo voltou a vigorar assim como a restauração dos sacerdotes como agentes de força religiosa e política. O jovem Tutancâmon acabou sendo um agente que legitimou a retomada da tradição contra as mudanças promovidas por seu pai e até adotou em seu nome a incorporação do deus Amon renegando o deus único de Akhenaton, já que seu nome de nascimento era Tutankhaton. O faraó rebelde foi atacado após sua morte através de uma deliberada prática de “apagamento” de sua história, quando seu nome foi retirado de obras, documentos e de registros dos reis, além de destruição de estátuas e homenagens.

Apesar do fracasso de sua revolução e da tentativa de forçar o esquecimento de sua existência, Akhenaton foi um dos faraós mais marcantes e fascinantes principalmente por causa de sua ação provocativa e inovadora. O faraó estabeleceu uma das mais antigas experiências monoteístas documentadas da história.