Elagabalus: Imperador (ou imperatriz) de Roma fora dos padrões

(Representação visual gerada pela IA Leonardo)

Os romanos tinham uma visão mais fluida da sexualidade do que as sociedades posteriores e a atração sexual entre pessoas do mesmo sexo não era automaticamente considerada tabu ou imoral, no entanto existiam parâmetros ambíguos sobre as relações sexuais entre homens e as atitudes a respeito da homossexualidade variaram longo do tempo.

Existem evidências de que a homossexualidade era aceita e até mesmo normalizada em certas épocas e contextos na Roma antiga. Por exemplo, a ideia de pederastia, onde um homem maduro se envolvia com um jovem adolescente, era considerada socialmente aceitável em certas classes sociais e no contexto militar. Em outros casos, especialmente quando envolvia um homem adulto se submetendo a ser penetrado, a atividade homossexual era vista como vergonhosa e degradante.

A legislação romana, a exemplo da Lex Scantinia, tinha restrições específicas em relação ao comportamento sexual, incluindo normas que proibiam relações sexuais entre homens livres, embora essas regras não fossem sempre aplicadas de forma consistente, sobretudo diante dos indivíduos mais poderosos. Este era destacadamente o caso do imperador Marco Aurélio Antonino, mais conhecido como Elagabalus ou Heliogábalo, que se envolveu em relações e comportamentos considerados fora das normas sociais.

O nome de nascimento do imperador era Sexto Vario Avito Bassiano e nasceu em Emesa, na atual Síria, em 204 d.C. Em seu tempo o Império Romano vivia uma situação de crise e inconstância em sua condução, com imperadores que regiam por curtos períodos e em meio a fortes conspirações e disputas por legitimidade e sua ascensão foi efeito desse contexto. Aos 14 anos de idade, o jovem sacerdote da divindade solar sírio-romana Elah-Gabal (da qual foi derivado o nome pelo qual se tornou conhecido) acabou sendo conduzido ao comando de Roma através de uma trama política arquitetada depois da morte do imperador Macrino, resultando ainda na deposição e execução de seu filho e sucessor designado Diadumeniano. Por ocasião de sua ascensão repentina foi alegado que Elagabalus era filho de Caracala, que foi imperador entre 211 e 217, e facções do exército resolveram apoiar a reivindicação que sequer foi tramada por aquele que assumiria o poder. Diante da situação, Elagabalus tornou-se imperador sem preparo e em condições de legitimidade que não eram plenamente estabelecidas.

O governo de Elagabalus foi muito problemático. Ele tentou implantar o culto a Elah-Gabal, buscando equiparar sua divindade devocional a Júpiter, rei dos deuses romanos, o que causou forte oposição e os posicionamento que escandalizavam as tradições também foi reforçado por sua imposição de seu “casamento sagrado” com uma virgem vestal Aquilia Severa, o que acirrou ainda mais os ânimos dos opositores, pois este ato, além de ilegal, era considerado uma profanação. Ele perseguiu generais e tradicionais famílias aliadas do poder imperial, designou seguidores de sua religião ou pessoas sem qualquer critério sensato para importantes cargos na estrutura estatal. Com o descontentamento crescente, foi pressionado por sua avô Julia Maesa (a quem designou como senadora e que que foi a articuladores de sua chegada ao poder) a adotar o primo Severo Alexandre como sucessor e a desfazer o casamento com Aquilia Severa, que era uma de suas cinco esposas, mas o imperador conseguiu gerar tamanha insatisfação que já não havia como retocar ou corrigir seu governo e para a maioria dos romanos foi um alívio quando ocorreu seu assassinato aos 18 anos de idade por membros de sua própria guarda após apenas 3 anos e 9 meses de no comando de Roma.

O imperador imaturo e despreparado, qualificado entre os piores de Roma, ficou mais conhecido por sua conduta e identidade sexual. Mesmo tendo contraído casamentos com mulheres, conforme o costume, a postura de Elagabalus era feminina. Vestia-se e maquiava-se feito mulher e há registros de que preferia que fossem usados termos femininos em sua referência. Além disso, eram declarados os seus casos com homens que favorecia com cargos e outros benefícios assegurados pelo Estado.

De qualquer forma, muito antes de se cogitar o conceito de pessoa transgênero, há sugestão de que esta era a condição de Elagabalus. Neste sentido, apesar de contrariar a tradição e o seu nome masculino, Elagabalus tem sido atualmente referido como como imperatriz, situação que quem tem sido praticada por estudiosos, apesar de ressalvas quanto ao fato de que as fontes que difamaram Elagabalus e que fundamentaram sua reputação como “afeminado” e de comportamento tomado pela devassidão terem prevalecido como narradoras de sua experiência no trono romano, havendo, além dessas fontes, poucos indícios de seu governo além de moedas e de estatuas de aparência masculina que tenham sobrevivido ao tempo. Assim, a identidade de gênero de Heliogábalo permanece o tema que prevalece a respeito de sua passagem no rol dos imperadores de Roma.


Referências:

6 comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados *