O culto sangrento a Xipe Totec, deus asteca da agricultura e do ciclo da vida

(Representação visual gerada pelas IAs Mage e Leonardo)

Xipe Totec é um deus asteca patrono de uma diversidade de aspectos importantes para a sociedade mesoamericana que o cultuou. Era o deus da primavera, das sementes e plantio e também de quem trabalhava com metais e pedras preciosas, porém o que mais chama atenção nesta importante divindade indígena é seu culto radical.

Seu nome significa algo como “Nosso Senhor Esfolado” no idioma Nahuatl e a identificação correspondia ao seu dono, pois ele era geralmente descrito e representado tendo seu corpo desprovido de pele. Segundo a crença, Xipe Totec se despojou voluntariamente da superfície de seu corpo como um gesto de benevolência, pois ela foi empregada como alimento para os homens. Seu auto-sacrifício está associado, conforme o mito, ao surgimento da agricultura, ao processo de fertilização da terra e aos ciclos desde a semeadura à colheita dos alimentos cultivados. A ausência de pele em seu corpo também pode ser uma representação da renovação dos ciclos naturais da própria existência, pois refere-se ao processo de vida e morte com a mudança de um estado para outro.

Sendo um ser sagrado associado à regeneração dos ciclos agrícolas e ao renascimento da vegetação, com a chegada da estação do plantio eram realizadas as principais celebrações em seu nome. O Festival Tlacaxipehualiztli (que significa “o ato de tirar a pele”) era o ápice do culto a Xipe Totec e durante este evento de fé da cultura asteca ocorriam ritos marcantes que envolviam danças, música rituais de oferenda e os marcantes sacrifícios. Prisioneiros de guerra eram vestidos com elementos ritualísticos e obrigados a realizar lutas como gladiadores enfrentando guerreiros astecas altamente preparados e muito melhor equipados para o combate. Esta luta desigual na qual os prisioneiros também tinham a mobilidade comprometida porque lutavam amarrados a uma pedra terminava em verdadeiros massacres realizados como sacrifícios em nome de Xipe Totec. Depois dos falsos combates, sacerdotes esfolavam as vítimas e “vestiam” suas peles imitando o próprio deus, que também era representando coberto por pele humana pintada como se fosse um tipo de vestimenta.

O Tlacaxipehualiztli era uma celebração brutal vista por meio de nossa perspectiva, mas seus praticantes não entendiam assim. Para os astecas, esta e outras realizações de sacrifícios eram ações que faziam parte da relação com as divindades. A morte por sacrifício era tida como um ato de fé por quem se oferecia voluntariamente ou poderia ser um destino mais honroso para quem estava nesta condição contra a vontade, como no caso dos prisioneiros de guerra. Os sacrifícios se encaixavam em uma estrutura cultural e religiosa  que para os astecas possuíam profundo sentido e propósito.

Os astecas acreditavam que se Xipe Totec se sentisse satisfeito pelas ofertas e pelas homenagens durante o Tlacaxipehualiztli, ele proporcionaria em contrapartida a fertilidade da terra para o novo ciclo agrícola, a continuidade da renovação dos ciclos da vida e da natureza, a boa relação com o povo que o cultuava, e, claro, a realização dos ritos também tinha seu papel como reafirmação do poder e autoridade mundana da elite asteca.

Apesar de sua aparência sinistra e de seu ritual violento, Xipe Totec era reverenciado pelo povo como uma divindade benéfica que proporcionava o sustento e a prosperidade. Os astecas não se apegavam à dicotomia que se resumia ao embate entre o bem e o mal, sendo seus deuses dotados de uma dimensão ambivalente, capazes de favorecer ou punir os humanos.   

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