Quando se imagina a figura de uma liderança pirata que causava pânico e que obteve fortunas com a prática criminosa nos mares geralmente surge a visão de algum homem com cara de mau, rabugento e aterrorizante, pois as criações no cinema, TV e na literatura alimentaram bastante este “modelo” de pirata, apesar das produções cômicas tentarem outras feições. Piratas são interessantes e fascinantes por razões diversas. E diante de todas as criações ficcionais, lendárias e de personagens reais, o mundo da pirataria pode ter sim aquela pessoa destacada como a mais bem sucedida de todos os tempos. E ela era mulher e era chinesa.

Ching Shih, também conhecida como Cheng I Sao (1775-1844) foi a pirata mais poderosa, capaz de fazer os famosos piratas que inundaram o Atlântico de peripécias parecerem meros aventureiros marinhos. Ela chegou a comandar uma frota de centenas de navios e milhares de piratas.

Seu começo não foi tão grandioso. Ela era prostituta em um bordel em Guangzhou quando foi raptada por bandidos marinhos de passagem por lá e depois casou-se, em 1801, com o comandante da Frota Vermelha, o pirata Cheng I (Zheng Yi), que chefiava uma considerável frota dividida em cinco grupos. Com a morte do comandante Cheng I, em 1807, Ching Shih conseguiu articular os apoios necessários para assumir o comando da frota. Agora conhecida como Cheng I Sao (“Viúva de de Cheng”), ela implementou um conjunto de regras e regulamentos rigorosos para a tripulação, que incluíam pena de morte para a deserção, traição e estupro. As regras eram estritamente aplicadas, e qualquer violação era punida severamente. Casou-se com o comandante Cheung Po Tsai, seu principal aliado na Frota Vermelha. Também tratou de ampliar o poder da frota até o ponto que por um período não havia marinha capaz de lidar com o poderio de sua organização pirata – nem a chinesa ou as marinhas da Inglaterra e Portugal que também tentavam atrapalhar a atuação dos comandados de Ching Shih. A Frota Vermelha realizou ataques a cidades costeiras, pilhou embarcações mercantis e militares, promoveu sequestros de autoridades e praticou inúmeras atrocidades contra quem reagisse.

Em 1810, o governo chinês decidiu agir contra a pirataria e montou uma grande campanha para acabar com as atividades de Ching Shih. Também começou a lidar com problemas internos em sua imensa frota, pois comandantes dissidentes chegaram a mudar de lado e passaram a atuar ao lado do governo como caçadores de piratas. No entanto, mesmo diante de uma força militar superior, ela conseguiu resistir aos ataques e negociou uma rendição vantajosa. Ching Shih garantiu o perdão para si e para seus seguidores, além de manter uma parte do saque acumulado ao longo dos anos. Após sua aposentadoria da pirataria, ela abriu um negócio legítimo em Guangzhou e viveu o resto de sua vida em paz.